“A isto Ele vos chamou por meio do nosso Evangelho: à posse da glória de Nosso Senhor Jesus Cristo. Portanto, irmãos, estai firmes e conservai as tradições nas quais fostes instruídos por nós, por palavra ou por carta”.
Já vimos, ao falar da Revelação, que a transmissão do Evangelho, da Boa Nova da Salvação, se fez de duas maneiras. “– oralmente, pelos Apóstolos que, na sua pregação oral, exemplos e instituições, transmitiram aquilo que tinham recebido dos lábios, trato e obras de Cristo, e o que tinham aprendido por inspiração do Espírito Santo; – e por escrito, por aqueles apóstolos e varões apostólicos que, sob a inspiração do mesmo Espírito Santo, escreveram a mensagem da salvação” (Dei Verbum 7; Catecismo da Igreja Católica, 76). Esta transmissão viva da verdade do Evangelho desde os Apóstolos chama-se Tradição. Não confundir com tradicionalismo. Como alguém escreveu, “a tradição é a fé viva dos mortos; o tradicionalismo é a fé morta dos vivos”. Se quisermos resumir, “a Tradição Apostólica é a transmissão da mensagem de Cristo, realizada desde as origens do cristianismo, mediante a pregação, o testemunho, as instituições, o culto, os escritos inspirados. Os Apóstolos transmitiram aos seus sucessores, os Bispos, e, através deles, a todas as gerações até ao fim dos tempos, tudo o que receberam de Cristo e aprenderam do Espírito Santo.” (Compêndio do Catecismo da Igreja Católica, 12)
2. Importância da Tradição
O Concílio Vaticano II dedicou uma parte significativa da constituição “Dei Verbum” a falar e explicar a importância da Tradição – a que chama Sagrada Tradição – para a transmissão da Fé. “Os Apóstolos, transmitindo o que eles mesmos receberam, advertem os fiéis a que observem as tradições que tinham aprendido, quer por palavras, quer por escrito (2 Tess. 2,15), e a que lutem pela fé recebida duma vez para sempre (Jud. 3). Ora, o que foi transmitido pelos Apóstolos, abrange tudo quanto contribui para a vida santa do Povo de Deus e para o aumento da sua fé; e assim a Igreja, na sua doutrina, vida e culto, perpetua e transmite a todas as gerações tudo aquilo que ela é e tudo quanto acredita” (nº 8). E acrescenta que esta transmissão viva da verdade revelada só é possível “sob a assistência do Espírito Santo”. Foi o Espírito Santo que inspirou os textos sagrados, mas também é sempre Ele o protagonista que conduz a Igreja e inspira quem tem a responsabilidade de fazer o discernimento entre a Tradição recebida diretamente dos Apóstolos e as vivências que a comunidade cristã foi assumindo.
Neste aspeto, a Igreja Católica distingue-se claramente das Igrejas Evangélicas e outras para quem apenas conta a Sagrada Escritura. É uma visão limitada, já que os Apóstolos expressaram com a sua pregação e vivência da fé, e aprenderam pelo Espírito Santo, muito mais do que aquilo que colocaram por escrito, e isso também passou a fazer parte do património de fé dos cristãos. “A Igreja não tira só da Sagrada Escritura a sua certeza a respeito de todas as coisas reveladas. Por isso, ambas (Sagrada Escritura e Tradição) devem ser recebidas e veneradas com igual espírito de piedade e reverência” (Dei Verbum,9). Nas palavras do Catecismo, “a fé cristã não é uma «religião do Livro». O Cristianismo é a religião da «Palavra» de Deus, não duma palavra escrita e muda, mas do Verbo encarnado e vivo” (nº 108).
3. Guardar e avançar
«Guardar» e «prosseguir» é a incumbência que cabe à Igreja por sua própria natureza, a fim de que a verdade contida no anúncio do Evangelho feito por Jesus possa alcançar a sua plenitude até ao fim dos séculos. Tal é a graça que foi concedida ao Povo de Deus; mas é igualmente uma tarefa e uma missão, cuja responsabilidade carregamos: anunciar de modo novo e mais completo o Evangelho de sempre aos nossos contemporâneos (…). Ao apresentar o Catecismo da Igreja Católica, São João Paulo II afirmava que «ele deve ter em conta as explicitações da doutrina que, no decurso dos tempos, o Espírito Santo sugeriu à Igreja. É também necessário que ajude a iluminar, com a luz da fé, as novas situações e os problemas que no passado ainda não tinham surgido» (…). A Tradição é uma realidade viva; e somente uma visão parcial pode conceber o «depósito da fé» como algo de estático. A Palavra de Deus não pode ser conservada em naftalina, como se se tratasse de uma velha coberta que é preciso proteger da traça! Não. A Palavra de Deus é uma realidade dinâmica, sempre viva, que progride e cresce, porque tende para uma perfeição que os homens não podem deter”. (Papa Francisco, Discurso aos participantes no Encontro por ocasião do XXV aniversário do Catecismo da Igreja Católica, 11 de setembro de 2017).
Para refletir e conversar:
1. Quando muitos cristãos querem que a doutrina cristã se adapte à sua medida ou à sua “opinião pessoal”, tenho consciência que faz parte da minha missão acolher, guardar e transmitir “as verdades da fé”?
2. Que situações ou questões da atualidade se colocam como desafio à Igreja?