No dia 7 de novembro deste ano completa-se o centenário da «revolução de outubro» (assim chamada devido à divergência dos calendários juliano e gregoriano), que implantou o socialismo soviético na Rússia. Numa secular mudança de regime, pretendia-se libertar o povo de uma opressão indigna, atribuir-lhe o poder de decisão sobre o seu próprio destino. Sabe-se o logro a que todo o processo conduziu: em poucos meses, o líder revolucionário tornou-se um centralista obcecado; à sua morte, sucedeu-lhe um ditador cruel e sem escrúpulos, a partir do qual perdurou um totalitarismo opressivo e desumano, de cujas ruínas emergiu um controverso regime oligárquico.
Pouco antes dessa «revolução de outubro», um outro acontecimento (que viria a ser interpretado como uma condenação dela) subvertia autoridades e questionava crenças: as notícias sobre as aparições de Fátima anunciavam uma libertação pela fé, gerando uma onda de fervores e contradições que se desenvolveriam, ao longo das décadas, num fenómeno misto de crença genuína, devoção superficial e comércio pseudorreligioso.
Está ainda por fazer a verdadeira revolução: a genuína, a de dentro, cuja falta talvez nenhum movimento de massas possa suprir.
Cem anos passaram. A revolução russa agonizou até à extinção, a de Fátima expandiu-se em visibilidade. No curso do tempo, há que colher as lições da História: entre a militância política e o zelo religioso, a cegueira ideológica limita tanto quanto a crença vaga dilui. Enjaulada em ideias e sistemas, acorrentada pelos hábitos em que se fecha e os bens em que se projeta, a humanidade continua a suspirar por uma libertação. Está ainda por fazer a verdadeira revolução: a genuína, a de dentro, cuja falta talvez nenhum movimento de massas possa suprir. Só a conversão de cada homem no íntimo de si mesmo poderá guiar a humanidade ao seu destino de transformação. Jesus Cristo anunciou-a no Sermão da Montanha; o Papa Francisco gritou-a no silêncio da Cova da Iria. Entre um e outro, homens e mulheres de todas as épocas, latitudes e credos, entregaram a vida por ela.
E nós?…
Paulo Vaz