“E depois do adeus” é para nós, portugueses, a canção que serviu de senha à revolução do 25 de abril, que tem cheiro a esperança e a liberdade, que marcou o princípio de muitas vidas, e que ainda hoje se renova ou se revive nas vozes que gritam as frases de ordem para que esta data seja eterna, “sempre”.
Mas gostava de colocar estas palavras na interrogativa e virar o olhar para a saída mal-amanhada, mesmo vergonhosa, no que aos direitos humanos diz respeito, da ocupação do Afeganistão. Depois do adeus esperávamos choro, mas não este triste êxodo aeronáutico. A nossa “silly season” foi, este verão, tudo menos “silly”.
Os políticos, jornalistas, comentadores já nos deram aulas de história e política internacional, mas afinal, parece que o que correu mal é que a humanidade tem aprendido muito pouco com a história. Em cada ocupação, os regimes mais preparados militar, estratégica e tecnologicamente voltaram de lá com o “rabo-entre-as-pernas”. E foram lá várias potências mas o sistema de justiça parou na Idade Média.
As notícias que chegam da instauração do novo poder Taliban não trazem nada de novo, pelo contrário, mostram como os velhos poderes anti-democráticos foram revisitados. Ironicamente, 20 anos depois do 11 setembro, os americanos sentem o sabor amargo do fracasso da invasão do Afeganistão: Talibans 2- Americanos 0. E como está hoje o barómetro da islamofobia numa parte do mundo e do antiamericanismo noutra parte? O que se construiu de diálogo inter-religioso nestes últimos 20 anos?
Li, algures, que o número de cristãos no Afeganistão varia entre mil e 8 mil (os censos, lá, não correm muito bem) e estimam-se 200 católicos no Afeganistão, se bem que li noutro artigo serem apenas 100. Não, não me enganei no número. Quando falarmos em minorias pensemos neste número. Sabendo que a conversão ao cristianismo pode ser condenada com a pena de morte, ainda há muitos corajosos.
E fui também procurar saber onde ficam as igrejas católicas no país. Então, a única igreja católica que existe no Afeganistão localiza-se dentro da embaixada da Itália em Cabul. Nós, os privilegiados que até em pandemia tivemos missa on-line todos os dias, e terço, e até catequese, entristecemo-nos por termos tão pouco, mas a nossa liberdade religiosa nunca foi beliscada.
Fazemos parte duma maioria que tem esta liberdade garantida. Que pena os Taliban não lerem a Fratelli Tutti! Quando pensamos globalmente, como é que a fraternidade pode ser mais que uma abstração?
Não há guerras justas, muito menos santas. “Com efeito Deus, o Todo-Poderoso, não precisa de ser defendido por ninguém e não quer que o Seu nome seja usado para aterrorizar as pessoas”(FT 285).
Não alimentemos, nós, ódios e vinganças. Façamos o que nos compete no acolhimento e na integração. E rezemos sempre uns pelos outros, para que a fraternidade seja mais do que uma palavra. Depois do adeus, deixámos lá irmãos a sofrer.
A reflexão é feita a partir do politicamente correcto antiamericanismo ou antiocidentalismo para inculcar um sentimento de culpa, pouco mais; porventura os cristãos residentes e resistentes hão -de ter outras razões para se sustentarem e perseverarem.