O Nobel da Paz 2018 foi consensual. Talvez só o Estado Islâmico e certas forças do Congo Kinshasa não tenham apreciado. Vamos à história: Nadi Murad tinha 21 anos quando, no Iraque, o Estado Islâmico entrou na sua aldeia yazidi (curda), habitada por este grupo étnico não muçulmano. A aldeia não aceitou converter-se ao islão. Os homens foram torturados e mortos e as mulheres feitas escravas sexuais. Quase todos morreram, ela foi uma das sobreviventes. Levada para Mossul, vendida, torturada e violada, diversas vezes, resistiu. Seria uma família muçulmana a abrir-lhe as portas á liberdade e à luta, facilitando a fuga para o Curdistão, onde havia um campo de refugiados. Ali se tornou o rosto desta comunidade massacrada. Atraiu a simpatia e o respeito da comunidade internacional, sendo a porta voz das mulheres yazidis. Chegaria à Alemanha para intervir junto das instâncias internacionais. Em Dezembro de 2015 falou na ONU, consternando o mundo. Em 2017 recebeu, do Parlamento Europeu, o Prémio Sakharov para os Direitos Humanos. Louva-se-lhe a coragem de explicar ao mundo, sem vergonha, a situação em que viveu.
O Dr. Denis Mukwege é um médico ginecologista do Congo Kinshasa. No contacto diário com mulheres vítimas de violação e outras agressões sexuais, durante a guerra e o contexto de violência que marca o dia a dia do seu país, decidiu dedicar a vida e a medicina a estas mulheres. Com apoios humanitários estrangeiros, construiu um hospital em Bukavu para tratar mulheres, marcadas, física e psiquicamente, pela agressão sexual. Em 2014, em Londres, lançou um grito contra a tragédia das violações em contextos de guerra, perante 80 ministros de 23 países. Contestou o facto de a violação ser utilizada como arma de guerra. O Dr. Mukwege não tem poupado políticos e militares nas suas intervenções. Venceu uma série de Prémios Internacionais (incluindo o Sakharov). Contesta abertamente o governo do seu país, posição que já lhe valeu diversas tentativas de assassinato. Mas, sempre que foge, logo regressa ao seu hospital e à sua missão de devolver dignidade, vida e esperança às mulheres vítimas de abuso.
Ambos sentem que este Nobel da Paz significa muito para todas as mulheres que, por esse mundo além, são vítimas de violências sexuais. É a estas que os laureados deste ano dedicam o Prémio. E a vida!