Cerca que quatro centenas de jovens, de mais de 20 nacionalidades diferentes, dos quatro cantos do mundo quiseram participar na “Familia Una”, uma proposta da família espiritana em Portugal que acolheu jovens, unidos pelo vínculo do carisma espiritano, para uma vivência da Jornada Mundial da Juventude. Por detrás do nome está o mote dos espiritanos “Cor unum et anima una” (At 4,32), um só coração e uma só alma. E foi isso mesmo que se viveu: um grande Pentecostes jovem.
Familia Una
Uma proposta da família espiritana em Portugal que acolheu jovens, unidos pelo vínculo do carisma espiritano, para uma vivência da JMJ 2023
“One bread, one body”
Foi com estas palavras que Emma Polen, estudante da universidade espiritana de Duquesne, nos EUA, sumarizou a sua experiência na Jornada Mundial da Juventude, parafraseando S. Paulo: “Somos um só pão e um só corpo” (1Cor 10,17). Emma foi uma das cerca que quatro centenas de jovens que participaram na “Familia Una”, uma proposta da família espiritana em Portugal que acolheu jovens de todo o mundo, unidos pelo vínculo do carisma espiritano, para uma vivência da Jornada Mundial da Juventude. Por detrás do nome está o mote dos espiritanos “Cor unum et anima una” (At 4,32), um só coração e uma só alma. E foi isso mesmo que se viveu: um grande Pentecostes jovem.
Os objetivos estavam bem definidos: ter uma experiência profunda de Deus em todos os momentos; fazer um caminho de santidade e de encontro com Jesus Cristo, em chave espiritana; conhecer a espiritualidade espiritana; ter um espaço para partilha de vida, de experiências, fé e missão; fazer uma experiência de Família Alargada Espiritana; convidar a um compromisso maior na vida de cada dia, nos diferentes ambientes; e participar ativamente em todos os momentos da JMJ. Os frutos, só com o tempo e a graça de Deus se poderão, porventura, vislumbrar. As sementes, essas foram seguramente lançadas, de forma gratuita e copiosa, através do esforço de uma incansável equipa coordenadora, apoiada por diversas equipas locais.
Aterrar
O primeiro momento da proposta, de 22 a 27 de julho, desenrolou-se em quatro locais diferentes onde os espiritanos vivem e trabalham: Braga, Barcelos, Porto e Régua. Os quase 400 participantes vieram de diversos países desde a América até à Ásia, passando pela Europa e África, reunindo, pelo menos, 23 nacionalidades. Nem todos os participantes eram católicos, e alguns nem eram cristãos. Representavam, contudo, o grande universo humano onde os espiritanos estão comprometidos. Foram divididos pelas quatro regiões, garantido a riqueza da diversidade, sem comprometer demasiado a capacidade de comunicação.
Acolhidos em famílias das comunidades locais, os jovens tiveram oportunidade de “aterrar” nesta jornada, conhecendo melhor a gente e a terra que os acolhe, partilhando as suas próprias experiências de vida e de fé, fazendo peregrinação, rezando juntos e com as comunidades, dialogando com a igreja local e seus movimentos e obras sociais, experimentando momentos de convívio e de lazer, de comunhão uns com os outros e com a natureza, e enriquecendo todos com diferença da sua cultura e identidade. Yu-shan, de Taiwan, um país onde a presença cristã é muito recente e minoritária, partilhou connosco a sua admiração pela quantidade de igrejas, tão cheias de longa história, que encontrou nas ruas de Braga. Lo pin, também de Taiwan, habituada a grandes cidades cheias de movimento, sublinha o “verdadeiro calor humano” que experimentou na tranquilidade da zona rural de Barcelos onde foi acolhida: “Encontramos a presença de Deus no acolhimento fraterno e no sorriso bondoso das pessoas.”
Unidade na diversidade
No início, a diversidade de línguas parecia um obstáculo, como descreve Yu-shan: “No começo estávamos preocupados com a língua e como comunicar com as famílias de acolhimento. Mas, com o coração aberto, mesmo escutando uma língua estranha, e usando língua gestual, conseguimos aproximar os nossos corações.” Maria Rosa, de uma das paróquias de acolhimento, na região de Barcelos, refere que foi o encontro com pessoas de tão diferentes nacionalidades, pontos de vista, expetativas e experiências de vida que “fez com que abríssemos mais a nossa mente para o mundo e para os problemas que nos rodeiam todos os dias e que, no final do dia, todos temos algo em comum, Deus no nosso coração”.
Emma Polen, dos EUA, sublinhou os momentos de oração como momento privilegiado de comunhão, apesar da diversidade de línguas. E a música foi também um fator de união: Kate Spadavecchia, estudante da universidade de Duquesne refere que “foi uma experiência extraordinária quando um grupo de músicos talentosos que queriam que as nossas vozes fossem ouvidas através da igreja, e nos convidavam a cantar com eles, mesmo em português”.
O sentido de inclusividade foi aliás, uma nota dominante da experiência vivida: “Cada vez que entrávamos numa conversa envolvendo jovens lusófonos, éramos integrados na conversa, apesar da barreira linguística. Seja da parte da coordenação, seja dos outros jovens participantes, todos se empenhavam para garantir que ninguém ficava de fora e tinha oportunidade de se envolver e partilhar”.
Samuel Té, jovem da Guiné-Bissau, sublinha a unidade na diversidade como o mais “maravilhoso” desta experiência: “Estar presente neste evento não é apenas relaxar e descobrir outras culturas, é acima de tudo responder ao apelo de que somos, antes de mais, filhos de Deus: “Só tendes um Pai, aquele que está nos céus”. É um apelo a mostrar que somos sinais de esperança neste mundo cada vez mais desesperado e renovar o nosso compromisso de cristãos, em intimidade profunda e pessoal com Nosso Senhor Jesus Cristo.”
Para Isabela Martins, do Brasil, o desafio da diversidade ajudou-a a crescer na familiaridade com Jesus: “fomos desafiados a sair da zona de conforto e encarar a diversidade que nossa igreja possui e o quanto ela pode nos oferecer. Vivemos momentos incríveis de dança, canto, oração e partilha, cujo foram essenciais para tornar estes dias tão importantes, no qual independente de estar ou não com uma bíblia na mão, Cristo estava presente em todos os momentos, até mesmo naqueles onde apenas nos reunimos para tomar um café e conhecer pessoas novas.”
“Na casa da Mãe”
Fátima é ponto de união, não apenas para portugueses, mas para todos os crentes, e não só. Foi ali que o Papa Francisco afirmou: “Esta é a casa da Mãe”, acrescentando que “uma Mãe tem sempre o coração aberto, para todos os filhos, todos, todos, todos, sem exceção”.
Até ao momento dispersos pelo norte do país, todos os grupos rumaram, no dia 28 de julho, até Fátima, tornando-se agora um grupo único. “Depois de vestir a t-shirt da “Familia Una”, tornamo-nos um só corpo com todos os outros participantes”, destacou, Lo Pin, de Taiwan. Os grupos da LIAM e JSF do Caneiro trataram de acolher toda aquela gente na sua paróquia.
O dia foi dedicado sobretudo à reflexão, animados pela espiritualidade ligada àquele lugar de peregrinação e ao lema da Jornada Mundial da Juventude. Lorena Souza, do Brasil, sublinha o papel de Maria na sua caminhada: “Visitar o Santuário de Fátima, foi firmar esse sentimento de que nunca estarei desamparada, que terei sempre uma mãe para me guiar ao encontro do Cristo e que me convida a sair ao encontro do outro apressadamente, a não me incomodar, não me fechar eu meu mundo, mas sobretudo a ser comunidade e rosto de Cristo.”
Foi também dedicado à celebração, juntamente com tantos outros peregrinos. Para muitos, foi uma experiência única. “Ao chegar a Fátima e ver a imagem de Nossa Senhora, fiquei emocionada.” – partilha Yu-shan, de Taiwan – “Na recitação do terço e procissão de velas, todos sentimos o amor de mãe de Nossa Senhora, e, sem dar conta, as lágrimas corriam-me pela face.” Wei-cheng, também de Taiwan, também sentiu a emoção: “Foi a primeira vez na vida que participei em tão grande procissão de velas. Quando cada pessoa levantava a sua vela acesa, ao contemplar tão grande mar de luz, o meu coração comovia-se e enchia-se de enorme gratidão.”
“Um só coração”
Os últimos três dias antes da JMJ foram vividos às portas de Lisboa, no Seminário da Torre d’Aguilha. Este momento foi batizado de “Cor Unum” (Um só coração) e, na verdade, conseguiu colocar centenas de corações a bater ao ritmo da missão. Celebrações, workshops e encontros temáticos sobre a Missão hoje, bem como momentos programados e improvisados de animação e partilha da riqueza cultural de cada jovem e de cada país encheram de festa e fé a Torre d’Aguilha.
Para os jovens da Irlanda esta experiência foi um convite a abrir o coração “que não tem fronteiras e transcende as diferenças de origem, nacionalidade, cor e religião e testemunha o amor de Jesus para com todos. Experimentamos construir o reino de Deus juntos. Partilhamos juntos, rezamos juntos e testemunhamos uma comunidade onde todos são incluídos e valorizados. Uma comunidade onde o amor de Deus se tornou visível para todos verem.”
Os participantes foram unânimes no sentimento de gratidão a todos e a todas que construíram esta proposta. Elisha Schoeneck, dos EUA, atribuiu o seu sentimento de comunidade a uma leiga associada espiritana em particular, a Raquel: “Colocou tanto esforço nesta atividade e quase não dormiu durante estas duas semanas. Apesar disso, acolhia todos de forma constante e genuína, passando tempo connosco e procurando conhecer-nos, sempre com um sorriso nos lábios”. E o mesmo se poderia dizer de tantas outras pessoas, ligadas às paróquias e movimentos da família espiritana.
O Seminário da Torre d’Aguilha acolheu a última parte das pré-jornadas “Familia Una”, já com todos os participantes presentes. Foi um tempo forte de aprofundamento do carisma missionário espiritano, de fortalecimento dos laços que nos unem e de fortes momentos celebrativos, como uma Vigília ao Espírito Santo e uma noite de adoração ao Santíssimo Sacramento
Encontro com o Papa
Depois desta experiência em família espiritana, o grupo mergulhou na grande aventura da JMJ, em comunhão com muitos milhares de outros peregrinos. Naturalmente, os olhos e os ouvidos abriram-se para um peregrino especial: o Papa Francisco. Alguns tiveram a graça de se cruzarem de perto com ele no caminho e ninguém ficou indiferente às suas palavras.
Samuel Té veio da Guiné-Bissau e a sua participação na JMJ, tal como outros três jovens de Moçambique, só foi possível graças à generosidade e empenho de tantos benfeitores da família espiritana. “Ver o Papa mesmo ao meu lado foi uma das maiores bênçãos da minha vida”, partilhou, sublinhando a simplicidade e abertura do Papa, a sua disponibilidade para todo o povo de Deus, particularmente para os seus jovens, apesar da sua idade e saúde.”
Melissa Tarrão, do Brasil, partilha também a mesma emoção: “Poder ter encontrado o Papa Francisco, vê-lo de perto é um sentimento inexplicável, a emoção tomou conta e só conseguimos chorar! As palavras que ele direcionou à juventude em toda a jornada fortalecem muito a nossa vida, a nossa fé e os nossos trabalhos pastorais.” Elisa Ribeiro, dos Jovens Sem Fronteiras, também teve a oportunidade de se cruzar algumas vezes com o Papa, “e de ver o seu brilho do olhar assim como de presenciar a enorme alegria que ele demonstrava por estar a viver aquela experiência”.
Agatha Nascimento também partilha do mesmo sentimento de tantos: “O acolhimento do Papa foi algo único. Ao ver ele falando a primeira vez senti o amor e a confiança do Papa na juventude. Foi único e emocionante esse momento que ficará marcado… levarei essa experiência para a vida. As amizades que fiz ficarão para sempre comigo e, principalmente, um sentimento de certeza que a jornada me trouxe: a certeza da minha fé e da minha missão.”
Na reta final da JMJ, depois de uma longa e cansativa caminhada para o “campo da graça”, onde decorreu a vigília e Missa de envio, muitos referiram o quão reconfortante foi, no meio de tão grande multidão, verem-se rodeados por caras conhecidas, amizades construídas ao longo das últimas semanas. Também sublinharam a atenção que sentiram durante as celebrações, apesar do cansaço e da dimensão da assembleia. “Ver um milhão e meio de pessoas de todo o mundo em adoração ao Santíssimo Sacramento, alcançados por Cristo (Fil 3,12), com os corações abrasados pelo Espírito, é uma visão que não posso esquecer”, escreveu Matthew Broeren, jovem espiritano em formação, sobre a vigília de adoração no campo da graça.
A próxima JMJ foi anunciada para Seoul, na Coreia do Sul, em 2027. Conversamos com o P. Kim, originário daquela diocese coreana e que trabalha como missionário em Taiwan. Olha para esta decisão com um misto de alegria e preocupação. O clima quente e húmido do verão naquela região não ajuda, bem como o facto de os católicas serem apenas 10% da população, o que implicará um grande esforço e potencialmente alguma oposição por parte dos não crentes. Por outro lado, é uma excelente oportunidade e sinal ver a JMJ voltar à Ásia, depois de Manila, nas Filipinas. “A JMJ não é apenas um evento católico, que ultrapassa fronteiras religiosas. As pessoas conhecem a Coreia pelo K-pop ou K-drama. Espero que na JMJ os jovens de todo o mundo possam experimentar o entusiamo dos católicos naquele país, e conhecer também a sua rica história”, partilhou o P. Kim.
Pelos corredores, já se ia sussurrando: “E que tal um Familia Una 2.0, na Ásia?”
A “Festa das Nações” encheu a noite de domingo com os sabores e as músicas de cada país, e muita, muita diversão.
Na vigília do Espírito Santo, os jovens encenam de forma dramática a necessária passagem da torre de Babel ao Pentecostes
P. Edmilson Semedo, com os jovens Argentina e Valdimiro, da missão de Nampula, e o Bonifácio, da missão de Itoculo, em Moçambique. Não se tendo realizado atividades de voluntariado jovem internacional este ano, os Jovens Sem Fronteiras decidiram proporcionar a jovens ligados às missões onde já se realizaram “Pontes Missionárias” a possibilidade de participarem na Jornada Mundial da Juventude. Para além destes três jovens de Moçambique, também participou o Samuel Té, da Guiné-Bissau.
Workshop sobre a obra de Auteuil, em França, que contou com a dedicação do beato espiritano Daniel Brottier, que veio a ser conhecido com o “Pai dos órfãos”, e que continua a contar com o compromisso dos espiritanos.
Não faltaram propostas de workshops, permitindo aos participantes mergulhar mais profundamente na missão espiritana, em diversas latitudes, e nas suas mais variadas vertentes: espiritual, social, cultural…