Na barca de Pedro, nesta grande família que a Igreja é e a que nós pertencemos, nem sempre é fácil estar juntos, remar no mesmo sentido e sentir que a viagem depende de todos. Alguns acham-se com mais direitos sobre a comunidade que os irmãos; outros sentem-se menos responsáveis e esperam que sejam os irmãos a assumirem a responsabilidade e a fazerem o esforço…
Palavra de Deus
Depois disto, o Senhor designou outros setenta e dois discípulos e enviou-os dois a dois, à sua frente, a todas as cidades e lugares aonde Ele havia de ir. Disse-lhes:
«A messe é grande, mas os trabalhadores são poucos. Rogai, portanto, ao dono da messe que mande trabalhadores para a sua messe. Ide! Envio-vos como cordeiros para o meio de lobos. Não leveis bolsa, nem alforge, nem sandálias; e não vos detenhais a saudar ninguém pelo caminho. Em qualquer casa em que entrardes, dizei primeiro: ‘A paz esteja nesta casa!’ E, se lá houver um homem de paz, sobre ele repousará a vossa paz; senão, voltará para vós. Ficai nessa casa, comendo e bebendo do que lá houver, pois o trabalhador merece o seu salário.
Não andeis de casa em casa. Em qualquer cidade em que entrardes e vos receberem, comei do que vos for servido, curai os doentes que nela houver e dizei-lhes: ‘O Reino de Deus já está próximo de vós.’ Mas, em qualquer cidade em que entrardes e não vos receberem, saí à praça pública e dizei: ‘Até o pó da vossa cidade, que se pegou aos nossos pés, sacudimos, para vo-lo deixar. No entanto, ficai sabendo que o Reino de Deus já chegou.’»
Lc 10, 1-11
A missão não é minha
Jesus escolheu doze que andassem com Ele e o seguissem mais de perto, mas para além desse grupo mais restrito e íntimo, havia uma multidão que o seguia habitualmente. Jesus a todos envolveu no desafio de anunciar o Reino e de participar da mesma missão. A missão entregue aos setenta e dois discípulos não era a missão deles, mas a de Jesus. A sua adesão a Jesus os comprometeu na missão dele, com a autoridade que Ele mesmo conferiu.
A missão desta grande família de discípulos, que é a Igreja, é de facto a própria missão de Deus: O Pai envia o Seu Filho Jesus, pela força do Seu Espírito Santo, para reconciliar consigo todas as pessoas, tornadas, pelo Espírito, participantes da condição divina de Jesus. Esta experiência de sermos filhos no Filho unigénito de Deus faz todos os cristãos participantes da mesma condição de enviados de Jesus, única cabeça deste grande corpo eclesial. A missão identifica-se com a nossa condição de discípulos: missionários, porque discípulos; discípulos, portanto, missionários.
A missão é nossa, é de Cristo connosco. Isso tem grandes implicações práticas: ninguém se pode agarrar a nenhum lugar, função ou estatuto dentro da paróquia, do grupo ou do movimento a que pertença. O facto de ter feito muito pela comunidade, a partir de um determinado lugar ou serviço, não dá o direito de alguém se considerar detentor desse lugar. Somos “servos inúteis”, sempre disponíveis para onde Deus nos enviar.
Ninguém se pode demitir da responsabilidade, como se esta fosse apenas de alguns, como os padres ou outros líderes. Quando percebemos que certos grupos de leigos (em que por vezes se incluem alguns grupos da LIAM!) só funcionam se o padre estiver, e são incapazes de qualquer atividade se o padre não vier, aí damo-nos conta do quanto precisamos de caminhar: o ministério do padre tem na Igreja um lugar imprescindível, mas o papel do leigo é igualmente decisivo. Se os leigos não podem substituir os padres naquilo que eles têm de específico e próprio, também é verdade que os padres não podem substituir os leigos naquilo que lhes é peculiar!
Pistas de reflexão
- Sentimos que a nossa comunidade paroquial já atingiu a maturidade cristã em que todos ocupam ativa e responsavelmente o seu lugar e as suas funções? E que dizer do nosso grupo da LIAM?
- Que podemos fazer de concreto para crescer mais neste sentido?
Unidos na família espiritana: a alegria de trabalhar juntos
Na família espiritana, tal como na globalidade da Igreja, há uma identidade comum, partilhada por diversas e complementares vocações. Se a Congregação do Espírito Santo, enquanto tal, é composta por membros professos (nos dois diferentes institutos religiosos, masculino e feminino), a família espiritual dos espiritanos é composta por diferentes grupos, movimentos e dinamismos, alicerçados na vocação laical. A grande alegria desta diversidade reside no dom comum que todos recebemos: a espiritualidade de Poullart des Places e de Libermann, enquanto espiritualidade missionária, que nos compromete ativamente na missão ad gentes e no serviço aos mais pobres. Ninguém é “dono” deste carisma e deste património comum: todos são convidados a beber desta única fonte e a ser canal desta vitalidade para os outros.
A LIAM, com os seus grupos missionários paroquiais, caminha há longas décadas na fidelidade a esta identidade espiritana. Também os JSF participam desta mesma identidade, enquanto movimento juvenil da família espiritana. Em sintonia, o MOMIP (Movimento Missionário de Professores), as fraternidades espiritanas, o pequeno grupo dos Viver sem Fronteiras, e mesmo a associação Sol sem Fronteiras, assumem a seu modo a única vocação missionária espiritana.
O voluntariado missionário espiritano tem-se desenvolvido nos últimos anos com muitos frutos: vários têm sido os leigos missionários que partem para missões espiritanas ad gentes, aí vivendo e trabalhando durante um ano ou mais, em colaboração com os missionários espiritanos residentes. A riqueza desta experiência de partilha tem sido enorme e deve ser cada vez mais potenciada e enriquecida.
De modo especial, os leigos associados espiritanos encarnam uma ligação institucionalmente forte com os espiritanos professos: partilhando com eles a missão, assumem, por um compromisso formal, uma pertença e uma colaboração missionária estável com os restantes membros da família espiritana.
O desenvolvimento destes múltiplos ramos da árvore espiritana apresenta muitos sinais de vida espiritual e missionária e deixa-nos com alguns desafios e muita esperança: espera-se uma cada vez maior abertura e colaboração entre movimentos e dinamismos espiritanos, muito caminho é preciso ainda percorrer; é necessária mais formação e aprofundamento sobre os nossos fundadores e a nossa identidade; é preciso definir melhor os modos concretos de colaboração na missão, tanto em Portugal, como nos compromissos ad gentes; cada movimento, cada grupo, precisa de aprofundar a sua própria identidade específica, enquanto grupo autónomo, para situar melhor a sua colaboração com os outros.
Pistas de reflexão
- O grupo a que pertenço tem consciência forte da sua pertença à família espiritana? Esta consciência é apenas afetiva, ou está alicerçada numa consciência e compromisso profundos?
- Que podemos fazer de concreto para melhorar a nossa colaboração missionária dentro do nosso movimento, com os espiritanos professos e com os outros ramos da família espiritana?
Compromisso
Reconhecemos o dom e a alegria de pertencermos a uma família espiritual comum, mas percebemos também o quanto precisamos de caminhar para aprofundar este sentido de pertença e desenvolver modos concretos de colaboração na missão. Sabemos que isso será para nós uma grande fonte de alegria e fecundidade missionária; por isso estamos decididos a nos empenharmos na procura de meios concretos de crescimento e amadurecimento da nossa vocação espiritana. Para isso, usaremos recursos como: fidelidade à oração (pessoal e comunitária) e à busca de aprofundamento da relação pessoal com Cristo, segundo a nossa identidade espiritana; assiduidade na participação em atividades de formação e partilha da família espiritana e do nosso movimento; cultivo de leituras espiritanas e missionárias; comunicação frequente com outros membros da família espiritana; empenho criativo e ativo em iniciativas de evangelização, mobilizando o nosso grupo e envolvendo-o na corresponsabilidade missionária da nossa Igreja local (ao nível da paróquia e da diocese). Manter-nos-emos interiormente disponíveis para tudo o que Deus nos pedir, inclusive partir para a missão ad gentes, como leigos missionários ou até como missionários professos (irmãos, irmãs ou padres)!
P. Pedro Fernandes