“Fortificai o meu trabalho, dirigi o seu curso, aperfeiçoai o seu fim, Vós que sois verdadeiro Deus e verdadeiro homem, e que viveis nos séculos dos séculos, Ámen.”
Tenho esta oração num pequeno papel no meu quarto, está sempre à vista mas olho poucas vezes para ele e não me recordo de onde o arranjei. Foi a propósito deste texto a incluir na AM do mês em que se celebra o Dia do Trabalhador que o revi, “googlei” o seu conteúdo e parece-me que encontrei o autor: São Tomás de Aquino. No original, esta parte surge no final de uma oração maior para antes dos estudos. E, de facto, neste trecho que citei surge “estudo” onde no meu papel surge “trabalho”. Bom, para o efeito, acho que não desvirtua o sentido geral da intenção da oração. Cada um, mediante a sua idade, estuda, trabalha ou goza de um merecido descanso. Mesmo nesta última situação se faz muito trabalho (cuida-se dos netos, aconselha-se e ajuda-se os filhos, luta-se com a doença, é-se exemplo, etc.). Trabalho não remunerado… mas como não o valorizar? Voltando a São Tomás, notei também o pormenor de rezarmos que Jesus, verdadeiro Deus e verdadeiro homem, vive “nos” séculos dos séculos. Isso indica-nos que Ele, tal como nós, não passamos mas estamos na História da humanidade, e que o nosso trabalho faz – ou pode fazer – a diferença para os atuais e futuros irmãos. Somos o Povo de Deus.
Parece-nos claro que a conceção cristã do trabalho não tem propriamente a ver com a conceção que existe no modelo económico dominante. Nesta, valoriza-se o trabalho que produz algo com valor económico e por esse motivo ele só faz sentido quando é remunerado. Se bem me recordo das longínquas aulas de economia, o trabalho é um dos factores de produção a juntar ao capital e à tecnologia. Na conceção cristã, a finalidade do trabalho é contribuir para a economia da salvação, ou seja, a concretização do ideal de Amor que Deus sonha e constrói também por nosso intermédio.
Não podemos ignorar nem uma nem outra conceção. Então como as conciliar numa lógica de Justiça e Paz? Como “forçar” os que não são discípulos de Cristo ou que não se preocupam com outra coisa senão o lucro financeiro, a respeitar o trabalho e não a vê-lo unicamente como um custo que se pretende o mais baixo possível? Lutando por essa causa onde nos for possível, como empregados, empregadores, políticos, sindicalistas, estudantes, filhos, netos, etc. Voltei entretanto ao quarto à procura de um livro que achava que me podia ajudar e lá encontrei outra forma, que é pelo testemunho. O livro é O Amor como critério de gestão de António Pinto Leite e a frase-chave, “aquele que investe é que sabe que retorno procura” (p. 44), a lembrar Mt 20, 15 na parábola dos trabalhadores da vinha. O autor dá o exemplo da sociedade de advogados de que é sócio e explica que a razão para proporcionar uma política laboral mais generosa não tem de ser necessariamente por querer em troca maior produtividade e entrega dos colaboradores, mas simplesmente “porque isso nos traz uma imensa compensação moral e humana”.
Este mês de Maio inicia-se com o Dia do Trabalhador e termina com o Dia do Corpo de Deus, ou a Solenidade do “Santíssimo Corpo e Sangue de Cristo”, para sermos mais correctos. A liberdade é uma característica que os une. A liberdade de Jesus em relação à sua vida (cf. Jo 10, 18) e a liberdade de empregados e empregadores relativamente ao que desejamos alcançar por meio do trabalho.