No exterior da belíssima Sé da Guarda, lá bem no alto, há uma gárgula, visível a custo cá de baixo, que representa um sim-senhor em posição de se aliviar na direção de Espanha. E muitos há que visitam a Sé só para se rirem com aquela anedota. Mas a Sé vale bem um outro olhar, de crentes e de amantes da arte.
No passado 11 de abril cliquei na edição online de um bem conhecido diário da nossa praça e dei-me com o seguinte título: “Papa diz que santo António é de Lisboa e não de Pádua”. Intrigado, percorri o texto, e aí, afinal, já se diz tão só que o papa cita o santo português como “santo António de Lisboa”, o que é muito diferente. Mas nem isto é verdade. Quem faz a citação desse jeito é o tradutor português da recente Exortação Apostólica “Alegrai-vos e Exultai”, e não o papa. Em todas as versões em outras línguas o que aparece é mesmo “santo António de Pádua”.
Este é apenas um pequeno exemplo de como se distorce a verdade em coisas de religião e da Igreja. Maior que a inverdade só a ignorância do articulista que escreve, três vezes, em latim, o nome da aludida Exortação e em vez de “Gaudete” (alegrai-vos), escreve “Gautede”. Lembrei-me da grotesca gárgula da Sé pela semelhança que tem com jornalistas assim. Como a Sé da Guarda também a Exortação referida vale bem um outro olhar, de crentes e de amantes da verdade. Vamos a isso.
É mesmo uma exortação. Texto simples, em tom coloquial, sobre a santidade, “o rosto mais belo da Igreja”, dom e vocação para toda a gente. Parece-me ver o papa sentado à lareira de cada família, falando a cada um, olhos nos olhos, coração a coração, da sua vida feliz no seguimento de Jesus. Ele mesmo nos diz para não esperarmos dele “um tratado sobre a santidade, com muitas definições e distinções (…) e análises”. Tem um objetivo humilde: tão só lembrar que o Senhor escolheu cada um de nós para ser santo, cada qual por seu caminho e com seu estilo.
Fez-me bem ouvir o saudoso P. Torres Neiva falar amiúde dos santos de avental e fato-macaco. Fico feliz pela concordância do papa, ao dizer-nos em sua Exortação que “para ser santo não é necessário ser bispo, sacerdote, religiosa ou religioso. (…) Todos somos chamados a ser santos, vivendo com amor e oferecendo o próprio testemunho nas ocupações de cada dia, onde cada um se encontra”. Mais feliz me sinto ainda ao ver o papa apontar “a santidade que existe nos pais que criam os seus filhos com tanto amor, nos homens e mulheres que trabalham a fim de trazer o pão para casa, nos doentes, nas consagradas idosas que continuam a sorrir”. A isso o papa chama santidade “ao pé da porta”.
Santos assim, tenho encontrado muitos no meu caminho e são para mim um grande estímulo. Queres experimentar, tu também, ser um santo de ao pé da porta? Com humildade e com a graça de Deus é bem possível. Primeira dica: lê a Exortação Apostólica.