29º Domingo do Tempo Comum
Aquilo que parece uma sentença sábia e simples (“dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus”), ao longo dos séculos deu origem a muitas tentativas hegemónicas e monopolistas, umas vezes por parte da Igreja, outras por parte dos poderes temporais.
Hoje, assiste-se a uma forma refinada de hegemonia, por parte do poder temporal, ao pretender-se relegar a dimensão religiosa para a esfera estritamente privada, sem espaço e oportunidades de manifestações públicas e de interferência nas atitudes, comportamentos e decisões sociais. Por isso, o reconhecimento de realidades e planos distintos, mas não contraditórios, nem opostos entre si, continua a ser uma exigência fundamental para a saúde individual e pública.
Por um lado, a chamada ‘autonomia das realidades temporais’, apelando à responsabilidade e ao compromisso de todos na construção da cidade terrena, não exclui necessariamente a visão cristã da História, cujo desfecho ficou decidido na Ressurreição de Cristo.
Por outro, esta visão cristã da História não transforma os humanos em marionetas, habilmente manobradas pela mão invisível de Deus, mas reconhece que Deus é o senhor da História, através da ação e intervenção dos ‘Ciros’ e ‘Césares’ de todos os tempos – sejam eles grandes ou pequenos – e sem que isso lhes retire a responsabilidade pelos seus atos e dos quais resulta, no dizer do papa Francisco, este “mundo baralhado com tantas quimeras, ferido por grandes frustrações e dilacerado por numerosas guerras fratricidas, que injustamente atingem sobretudo os inocentes”.
O Dia Mundial das Missões que hoje celebramos é ocasião propícia para renovarmos o nosso empenho missionário com esta lucidez e com a consciência de que “a missão se funda sobre o poder transformador do Evangelho. Este é uma Boa Nova portadora duma alegria contagiante, porque contém e oferece uma vida nova. Por meio da proclamação do Evangelho, Jesus torna-se sem cessar nosso contemporâneo, consentindo à pessoa que O acolhe com fé e amor experimentar a força transformadora do seu Espírito Ressuscitado que fecunda o ser humano e a criação, como faz a chuva com a terra”.
De facto, “o mundo tem uma necessidade essencial do Evangelho de Jesus Cristo. [É] Ele [que], através da Igreja, continua a sua missão de Bom Samaritano, curando as feridas sanguinolentas da Humanidade, e a sua missão de Bom Pastor, buscando sem descanso quem se extraviou por veredas enviesadas e sem saída”.
É deste ‘pão da esperança’ que o nosso mundo está faminto. Trata-se de uma fome que nenhum ‘César’ ou ‘Ciro’ pode saciar, mas que a Igreja pode e deve oferecer pelo seu testemunho, amassado na ação e no anúncio de Jesus Cristo, o único Salvador.