Em muitos aspetos notáveis, a Europa é o berço do homem novo. Ao longo dos séculos, tem-se constituído como uma referência inegável na construção contínua dum desenvolvimento humano jamais visto na história humana. Um desses aspectos é, precisamente, a procura e a edificação dum mundo mais justo e pacífico.
Não é por acaso que a Europa está e deve estar comprometida com a justiça e a paz à escala global. Embora ultrapassada por muitos avanços tecnológicos, a Europa não deixou de estar na base de quase tudo, inclusive da formação dos alicerces socioeconómicos e culturais das sociedades pré-modernas, atento o seu papel preponderante na colonização e cooperação com antigas colónias.
Ao contrário do que acontece no Médio Oriente e no Norte de África, muitos países europeus (entre os quais Portugal) gozam de uma paz duradoira, fruto de longos anos de luta, erros, acordos e desacordos, enfim, de compromissos de justiça e paz. Em todos eles, a Europa estabeleceu-se como uma espécie de mãe, que não pode dar-se ao luxo de ficar de braços cruzados, enquanto a casa que ajudou a construir é arrasada.
Aqui está a justificação para o facto da Europa não se poupar na defesa daquilo que se lhe pode atribuir como um legado. Mas o problema que eu levanto não é acerca do quê, mas do como. Como é que a Europa ou o mundo ocidental, cada vez mais afastados da sua origem, se comportam perante a falta de justiça e paz no seu seio e no mundo inteiro?
Há uma relação e interligação entre Deus e justiça/paz. Sem prejuízo da jurisprudência, a justiça ou a justeza das coisas na sua essência, tal como Deus não obedece a um paradigma mutável. Quem se-afasta desta ligação afasta-se também de uma realização plena dos bens da justiça e paz.
Assistimos hoje a um ocidente secularizado, onde os monumentos religiosos já não marcam o ritmo da vida, onde as igrejas rapidamente se vão tornando museus do sagrado e o clero é encarado como se fosse funcionário do sagrado em vez de um sacerdote que faz a ponte entre Deus e os homens; uma cultura que quer as portas das igrejas fechadas e os ministros do sagrado fora; uma cultura onde tudo depende do que convém no momento. Um mundo que se envergonha de Deus, não pode ser justo, nem gozar a verdadeira paz.
Como é que se pode compreender uma Europa que só se limita a fazer referência às suas raízes cristãs? Por que é que tantos líderes políticos europeus estão determinados, ou pelo menos assim parece, em apagar mil e quinhentos anos da história europeia da memória coletiva? Por que os intelectuais europeus consideram qualquer referência às raízes cristãs e às fontes dos compromissos europeus uma afronta à liberdade e ao futuro da democracia? Onde e como é que a Europa errou? O problema europeu, parece me, é fundamentalmente um problema da moral cultural e civilizacional sem prejuízo a lacuna demográfica.
Esta fuga das raízes condiciona as pessoas a olhar só para o imediato, esquecendo-se que um compromisso pela justiça e pela paz implica e radica-se num compromisso com Deus. Esta fuga que limita os horizontes apresenta uma versão da justiça e paz desfocada que só compreende justiça e paz como punitiva e condenatória, vingativa ou recriminadora descurando a equidade e um ajuste honesto das contas. Fazendo minhas as palavras de um dos grandes pensadores e filósofo Alemão de século XX, Martin Heidegger, “já só um Deus pode nos salvar”
P. Simon Ayogu