6º Domingo do Tempo Comum
Emboa possa parecer uma simples subtileza, mais própria para um passatempo do que para uma reflexão sobre a Palavra de Deus deste domingo, esta pergunta parece-me extremamente oportuna.
Com efeito, no tempo de Jesus – e não só – a todo o leproso era imposto ficar ‘fora’ das povoações, para se evitar ao máximo o contágio de doença tão estigmatizante, física, psicológica e religiosamente. Daí a coragem, quer deste leproso em aproximar-se de Jesus, quer de Cristo em consentir a sua aproximação e, ainda por cima, em tocar-lhe.
Não menos interpelativa também é a afirmação que Jesus “ficava fora”. Não por medo ou por indiferença, isto é, ‘de fora’, mas para nos dizer que, para Ele, ninguém ficava ‘de fora’ do seu amor, da sua atenção, do seu ‘olhar’, particularmente aqueles que a sociedade punha ‘fora’: todos os desalinhados do “social e religiosamente correto”, para se ver livre do incómodo que eles lhe acarretava. Por isso, o próprio Cristo vai ser morto ‘fora de portas’.
De facto, para se ir ao encontro de Cristo é preciso romper com estes muros que a sociedade – e nós próprios -levantamos, para nos defendermos destes intrusos que podem perturbar a nossa tranquilidade. Quantas situações, nos nossos dias, clamam por alguém que rompa o ‘socialmente (e hipocritamente) correto’, que não se detenha comodamente diante do “foi sempre assim” ou “a lei é bem clara”, para que o nosso “olhar” nos leve também até junto da pessoa humana e nos deixemos desafiar pelas gritantes situações de injustiça, de incompreensão, de miséria e de abandono em que tantas pessoas vivem encurraladas e proscritas!
Quantas vezes nos contentamos em construir e manter albergues de acolhimento, hospitais, lares e velórios, para onde ‘despachamos’ aqueles que nos incomodam, tentando assim evitar o encontro com a mais insofismável das verdades: a nossa fragilidade, a nossa vulnerabilidade, a nossa transitoriedade, que o Dia de Cinzas nos vai recordar: “lembra-te, ó homem, que és pó e ao pó hás-de voltar”!
Mais que as distâncias geográficas (“fora”) importa que aproveitemos esta Quaresma para eliminar as distâncias do coração (‘de fora’), para que ninguém fique ‘fora’ do nosso olhar e do nosso coração! E podemos começar já hoje – Dia Mundial do Doente – levando o nosso olhar e o nosso coração junto de algum doente ou idoso, familiar ou não, conhecido ou desconhecido, correspondendo ao apelo do Papa Francisco: “ao dom de Jesus corresponde o dever da Igreja, bem ciente de que deve pousar, sobre os doentes, o mesmo olhar rico de ternura e compaixão do seu Senhor”.
Eis algumas afirmações do papa Francisco na sua mensagem para este Dia Mundial do Doente:
– “A imagem da Igreja como ‘hospital de campanha’, acolhedora de todos os que são feridos pela vida, é uma realidade muito concreta nalgumas partes do mundo” e deve ser inspiradora para o agir de todas comunidades cristãs”;
– “A pastoral da saúde permanece e sempre permanecerá um dever necessário e essencial, que se há de viver com um ímpeto renovado, começando pelas comunidades paroquiais até aos centros de tratamento de excelência”;
– “Em todo o lado, a Igreja procura cuidar, mesmo quando não é capaz de curar”.