Domingo da Santíssima Trindade
Sempre me impressionou a ligeireza e a falta de dignidade com que é feito, por muitos, o sinal da Cruz e a forma apressada e leviana como se reza o louvor à Santíssima Trindade: “glória ao Pai e ao Filho e ao Espírito Santo…”! Com efeito, sendo eles os nossos sinais distintivos de cristãos, mereciam de todos nós mais atenção e respeito. Na verdade, centrando-se aqui a nossa originalidade, esta forma de agir não pode despertar grande interesse em quem nos ouve e nos vê.
Ao menos, no dia de hoje, procuremos dar-lhe mais atenção, dignidade e respeito, pois é particularmente em relação ao mistério da Santíssima Trindade que as nossas palavras são pequeninas! Com elas, o mais que podemos dizer é o que o nosso Deus não é! Mesmo que o Espírito Santo nos revele – como prometeu Cristo – toda a verdade, ainda ficamos muito longe, porque tanta grandeza não cabe em nós!
É bem oportuno este texto de S. Columbano: “Ninguém tenha a presunção de poder descobrir os mistérios incompreensíveis de Deus: o que foi, como foi, quem foi. São realidades inefáveis, insondáveis, impenetráveis; deves limitar-te a acreditar com toda a simplicidade, mas com grande firmeza, que Deus é e será sempre como foi, porque Deus é imutável. Quem é Deus? O Pai, o Filho e o Espírito Santo são um só Deus. Não pretendas saber mais acerca de Deus; porque os que querem descobrir as profundidades insondáveis, devem primeiro considerar a natureza do universo. Com razão se compara o conhecimento da Trindade à profundidade do mar, como diz o Sábio: Quem poderá investigar a profundidade insondável? Assim como a profundidade do mar é invisível aos olhos dos homens, assim a divindade da Trindade é incompreensível às faculdades humanas. E por isso, se alguém quiser conhecer aquilo em que deve crer, não pense que o entenderá melhor discutindo do que acreditando: o conhecimento da divindade, quanto mais se discute, mais se afasta de nós… Deus é invisível e devemos crer n’Ele tal como é; no entanto, um coração puro pode, de certo modo, contemplá-l’O”.
De facto, a única porta de acesso a este Mistério – o mistério por excelência – é a porta do coração, é a porta do amor: o nosso Deus é esse Amor transbordante, que deixa as suas impressões digitais bem visíveis na obra da criação, nela podendo nós admirar não só a grandeza e beleza da diversidade, mas também a harmonia reinante. É esse mesmo amor trinitário que assina com tinta de sangue a obra da nossa redenção e que nos coloca na sua sintonia pelo Espírito Santo, “que foi derramado nos nossos corações.”, como afirma S. Paulo.
Por isso, a única atitude possível face a este Mistério é de contemplação e adoração – “Trindade Santa, Eu Te adoro” -, mas igualmente de súplica, para que, feitos à sua imagem e semelhança, sejamos construtores da comunhão e da harmonia, edificadas e enriquecidas pela originalidade de cada um, para isso encarada não como concorrência e ameaça, mas como um contributo indispensável e insubstituível. Com efeito, só com a Trindade e n’Ela poderemos passar do ‘eu’, individualizante e egocentrista, para o ‘nós’ da harmonia, respeitadora da diversidade, e da comunhão, construída na diversidade enriquecedora de todos e cada um.