4º Domingo da Quaresma
O evangelista S. João construiu a narrativa deste episódio da cura de um cego de nascença de forma a tipificar as possíveis atitudes face Àquele que é “a verdadeira Luz que, vindo ao mundo, a todo o homem ilumina” (Jo.1,9) e, assim, nos levar a questionarmo-nos a nós próprios sobre qual será a nossa posição em relação a Jesus Cristo, a única Luz que nos permite ver de verdade.
Assim, naquele cego, podemos ver todos aqueles que, não vendo, tudo fazem para conseguir ver: ele suplicou, cumpriu as instruções, sujeitou-se a repetidos e inúteis interrogatórios, foi injuriado e irradiado, mas obteve a visão completa – a fé: “creio, Senhor!”.
No extremo oposto estão os fariseus, que, julgando ver, se fecham perante a evidência do milagre, recorrendo até, para isso, às ‘lentes’ da Lei e de Moisés.
Posição intermédia e, por isso, dúbia, assumem os pais do miraculado que, num equilibrismo arriscado, não recusam o milagre, mas remetem para o miraculado a descrição do sucedido, evitando assim os riscos da exclusão. Libermann comenta assim esta atitude: “Estas pobres pessoas tiveram força bastante para nada dizer contra o divino Salvador, e até para sustentar em seu favor tudo aquilo que não as culpabilizava diante dos Fariseus, mas, por não terem ousado sustentar toda a verdade,” [pois tinham medo de] “serem expulsas da sinagoga e, a partir daí, olhadas por todos os Judeus com desprezo e horror, separadas e abandonadas por todos, perderam graças que o seu filho alcançou pelo ardor das suas respostas” (Comentário ao Evangelho de S. João). Não será isso que acontece também connosco tantas vezes?
Aproveitemos este tempo da Quaresma, em quarentena forçada, para uma consulta – ainda por cima, gratuita e sem necessidade de deslocações – no verdadeiro Oftalmologista, que é Cristo, para melhorarmos a qualidade da nossa visão, tantas vezes enfraquecida pelos condicionantes esquemas das nossas certezas, do nosso comodismo, dos nossos interesses e dos jogos de equilíbrio em que facilmente caímos.
Jesus, que é a “luz do Mundo”, é também a verdadeira ‘Siloé’, isto é, o ‘Enviado’ pelo Pai, que veio para nos libertar da cegueira interior. Acreditar n’Ele é ter esta visão interior, que nos permite distinguir a verdade da aparência. E num tempo como o nosso, em que se privilegiam as aparências, o causar boa impressão e o alinhar pelo socialmente correto, quão necessária é esta visão interior, para, mesmo tendo de remar contra a corrente, sermos capazes de manter o nosso olhar fixo nos verdadeiros valores e sermos verdadeiros e corajosos seguidores de Jesus, à semelhança do miraculado do evangelho deste domingo.