Solenidade da Ascensão
A proposta que a Palavra do Senhor da solenidade da Ascensão nos faz – “Porque estais a olhar para o céu? Ide por todo o mundo e pregai o Evangelho” – representa um programa de vida em que os olhos devem estar bem fixos no Céu, mas com os pés bem assentes na terra.
Sendo uma ‘receita’ fácil de aviar, convenhamos que a sua aplicação é tarefa bem mais complicada! Que o digam os extremismos e inúmeras tentativas de equilibrismos que ao longo dos tempos foram aparecendo. Com razão, pois, Paulo pede, no texto da Carta aos Efésios, que o Senhor ilumine os olhos do nosso coração para compreendermos a esperança a que fomos chamados, os tesouros de glória que nos estão reservados e a incomensurável grandeza do seu poder com que atua em nosso favor, tal como fez em favor de seu Filho, ressuscitando-o dos mortos e colocando-o à sua direita nos Céus.
Tratando-se de polos de atração totalmente opostos, cabe a cada um/a de nós não só evitar qualquer concretização de extremismo (angelismo ou materialismo), mas também tudo fazer para que sejam os olhos, isto é, o nosso coração, a estar fixos no Céu e os pés bem assentes na terra.
É que o pseudo equilibrismo de ‘um pé cá’ e ‘um pé lá’ é outra tentação que constantemente nos espreita. Pensando que poderemos juntar no mesmo saco quanto pudermos aproveitar deste mundo com uns pós do outro, acabaremos por não ser “nem peixe, nem carne”.
A verdadeira ligação destes dois ‘mundos’ passa por nos empenharmos, com os dois ‘pés’, na configuração deste mundo pelos valores do Reino, realizando os ‘milagres’ referidos por S. Marcos: expulsar os demónios do individualismo; falar a linguagem universal do amor; ser mais fortes que as serpentes do fascínio e que os venenos do ódio; curar as doenças da solidão, da indiferença e do abandono, o que só poderá acontecer na medida em que mantivermos os olhos fixos no Céu.
Maria interpretou bem esta síntese: abrindo-se totalmente à vontade e aos planos de Deus, nunca se esqueceu de ir ao encontro de quem precisava de ajuda e continua a fazê-lo hoje em favor de seus filhos, através das suas aparições em Fátima e por todo o mundo, deixando-nos a sua recomendação de Caná: “fazei tudo o que Ele vos disser”. Como afirmou o Papa Francisco, “há um estilo mariano na atividade evangelizadora da Igreja. Porque sempre que olhamos para Maria, voltamos a acreditar”, isto é, a ter os pés bem assentes na terra, mas os olhos do coração bem fixos no Céu!
O Papa Francisco aplica este ensinamento ao universo da comunicação social apontando na sua mensagem o “ir e ver” como o “método de toda a comunicação humana autêntica”, pois “é necessário sair da presunção cómoda do ‘já sabido’ e mover–se, ir, ver, estar com as pessoas, ouvi-las, recolher as sugestões da realidade”. Doutra forma, “a crise editorial corre o risco de levar uma informação construída nas redações, diante do computador, nos terminais das agências noticiosas, nas redes sociais, sem nunca sair à rua, sem ‘gastar as solas dos sapatos’.
Sobre a internet, afirma o Papa que “é um instrumento formidável, que nos responsabiliza a todos como utentes e desfrutadores. Graças a ela, temos a possibilidade de contar o que vemos, o que acontece diante dos nossos olhos, de partilhar testemunhos”. Mas, “entretanto, foram-se tornando evidentes, para todos, os riscos de uma comunicação social não verificável”. Uma “consciência crítica impele-nos não a demonizar este instrumento, mas a uma maior capacidade de discernimento e a um sentido de responsabilidade mais maduro, pois todos somos responsáveis pela comunicação que fazemos, pelas informações que damos, pelo controlo que podemos conjuntamente exercer sobre as notícias falsas. Todos somos chamados a ser testemunhas da verdade: a ir, ver e partilhar”.
O grande comunicador Paulo de Tarso “ter-se-ia certamente servido do e-mail e das mensagens eletrónicas; mas, foram a sua fé, esperança e caridade que impressionaram os contemporâneos que o ouviram pregar e tiveram a sorte de passar algum tempo com ele. O Evangelho volta a acontecer hoje sempre que recebemos o testemunho transparente de pessoas cuja vida foi mudada pelo encontro com Jesus. Por isso, o desafio que nos espera é o de comunicar, encontrando as pessoas onde estão e como são”.