Domingo de Páscoa
A solenidade daquele Sábado – “era grande aquele sábado”, assim escrevem os evangelistas – não foi manchada pela execução, que na véspera aconteceu, de mais três ‘malfeitores’. Com efeito, as cruzes já faziam parte da paisagem e os seus últimos ‘inquilinos’ não se distinguiam de todos os anteriores. Por isso, com o pôr-do-sol e o acender das luzes – começava então o novo dia – tudo regressou à normalidade, exceção feita a alguns familiares e próximos das vítimas – se é que os tinham. Nada de anormal aconteceu e, provavelmente, nem preciso foi qualquer reforço policial para manter a ordem.
Por isso, pode afirmar-se que se Jesus, pelo seu nascimento em Belém, entrou silenciosamente no mundo, não foi de maneira diferente que dele partiu, agora em Jerusalém. Na verdade, na grandeza daquele sábado não havia lugar para a dor, a tristeza e o choro do pequeno grupo dos seus discípulos.
E o dia seguinte – ‘o primeiro da semana’ – também acordou sonolento e pesado, após uma noite de sono profundo, originado por refeição festiva, regada pelo abundante e bom vinho da região, sobretudo para os fariseus, autores da ‘limpeza’ religiosa levada a cabo com muito custo.
Não foi assim para Maria Madalena: bem de madrugada ainda, ela dirige-se pressurosa para o lugar “onde tinham sepultado o corpo de Jesus”. Perante o inesperado da violação do sepulcro e do desaparecimento do ‘defunto’, mais apressadamente ainda ela procura Pedro e João para dar o alarme do acontecido. Nova correria começa, agora a três, para verem com os próprios olhos.
Até aqui, o texto de João limita-se a relatar-nos as apressadas movimentações dessa manhã, a primeira da nova era. Perante os indícios (as ligaduras e o sudário), só João “viu e acreditou”. De Pedro e Maria Madalena se diz que “ainda não tinham entendido a Escritura, segundo a qual Jesus devia ressuscitar dos mortos”. A Ele vê-lo-ão mais tarde, em circunstâncias diferentes, mas com os mesmos resultados em todos: vão transformar-se em testemunhas da Ressurreição todos aqueles que comeram e beberam com Jesus, depois de Ele “ter ressuscitado dos mortos”, como nos diz S. Pedro no texto dos Actos dos Apóstolos.
Esta foi e é a manhã da ressurreição, a manhã do novo “dia que o Senhor fez”, no qual somos convidados a alegrar-nos e a exultar, mas que continua a passar despercebido para muita gente, mergulhada na correria contínua da vida, sem tempo para ver e acreditar nos sinais da mudança radical, e, por isso, caminhando desalentada pelas inúmeras estradas de Emaús dos nossos dias. É que se, na semana anterior, a palavra mais forte foi a da maldade e, por isso, do sofrimento e da morte, diante dos quais Deus como que se cala, esta é a manhã da palavra definitiva de Deus: a vida venceu a morte, o bem venceu o mal!
Esta é a palavra que perdura e que precisa de continuar a ecoar aos ouvidos dos nossos contemporâneos, muito para além dos cortejos pascais que em muita parte continuam a acontecer. Seja cada um de nós também testemunha convicta e alegre do Senhor Jesus, para que a manhã da ressurreição seja anúncio e prenúncio do tempo novo, inaugurado pela paixão, morte e ressurreição de Cristo!