Tira as tuas sandálias dos pés, porque o sítio em que pisas é terreno sagrado. (Êxodo, 3, 5)
Assustam-me as pessoas demasiado fanáticas… demasiado abnegadas… demasiado religiosas… demasiado santas… que parecem tão perto de Deus!
Quase sempre são pessoas que se afastam dos irmãos para estar (acreditam elas) mais perto de Deus, ou então apenas se juntam àquelas que lhes permitem atingir os seus propósitos de fanatismo.
Pela fé aceitamos que o ser humano é o único ser em constante e progressiva construção, por estarmos em permanente estado de relação com todas as circunstâncias em que estamos inseridos, não somos seres isolados, somos pessoas a construir-se em relações de amor e a caminho da comunhão universal. Podemos dizer, pois, que a imagem de Deus se está a constituir como uma comunhão orgânica, interativa e fecunda em cada um e na totalidade da humanidade… a construir-se na nossa imperfeição… na nossa fraqueza, num caminho que se quer aberto ao sempre novo e, às vezes, estranho.
Com efeito, uma pessoa que ao longo da sua vida se feche de modo progressivo ao encontro e ao amor, acaba por ficar um esboço inacabado e não uma imagem perfeita de Deus.
Quando nos opomos ao amor, estamos a opor-nos à ação de Deus em nós e, portanto, a recusar-nos ser imagem de Deus. Este, na Sua forma muito maternal de amar vai-nos interpelando e iluminando no dia a dia da nossa vida, ajudando-nos a esculpir de modo fiel a Sua imagem, em gestos novos, em palavras renovadas e em vidas em constante transfiguração.
No entanto, estando constantemente connosco, jamais nos substitui, pois seremos tanto mais imagem de Deus quanto mais nos realizemos como seres livres, conscientes, responsáveis e capazes de comunhão amorosa.
Acredito, veemente, que somos seres em construção, precisamos de tempo para emergirmos como pessoas e convergirmos para a comunhão amorosa.
Que felizes são as pessoas que procuram auscultar a vontade de Deus e agir de acordo com ela, pois a vontade de Deus coincide rigorosamente com o que é melhor para nós!
A nossa vida, esta vida em que existimos no tempo, é a oportunidade de nos aperfeiçoarmos, não a de sermos, ou nos considerarmos, perfeitos. É a possibilidade de nos erguermos até à estatura de Cristo, de nos cristificarmos… de nos fazermos cristãos.
Isto quer dizer que a nossa vida espiritual emerge e ganha densidade eterna enquanto vivemos no tempo. Seremos eternamente o que construímos enquanto vivemos aqui. Por outras palavras, vista à luz da eternidade, a vocação fundamental do ser humano é realizar-se como pessoa mediante o amor que partilhamos.
Vistas a esta luz, as manhãs surgem como um convite a aproveitar o novo dia, pois é uma nova oportunidade para fazer emergir no tempo o que seremos eternamente.
A Carta aos Efésios diz que tu, Espírito Santo, és o grande escultor da imagem de Deus em nós, a qual se edifica sobre a justiça e a santidade (Ef 4, 23-28). Pois que Te deixemos Ser em nós, sem pretensões, sem vaidades, sem exigências exasperantes quer para nós, quer para aqueles que connosco caminham. Faz-nos santos ensinando-nos a humildade de o sermos.