No início do século XX, partir em missão significava arriscar a saúde, não raras vezes a própria vida, e não voltar a ver a família a não ser depois muitos anos ou até nunca mais. Daí a dificuldade, amigo leitor, que o P. Brottier teve em comunicar o facto à família. Aliás, quando, por fim, escreveu aos pais e ao irmão, este respondeu com grande vivacidade à notícia.
Mas a decisão estava tomada. O P. Brottier respondeu assim ao irmão: «A decisão que hoje tomo é o resultado de longas reflexões. Tive a ideia aos 12 anos. Deves pensar se, depois deste tempo, não dei voltas em todos os sentidos ao assunto. Também pensei muito na pena que causaria aos nossos pais. Tenho, porém, confiança de que Deus nos dará a todos a consolação de cumprir corajosamente com um grande dever».
Entretanto, o P. Daniel Brottier recebeu carta do P. Genoud, dizendo-lhe: «Vinde no começo das férias com a ideia de que, terminado o vosso retiro, ficareis no noviciado». A esta carta, o P. Daniel Brottier respondeu a 6 de Junho de 1902. É com muito gosto que partilho consigo, caro leitor, estas palavras de fogo:
«A vossa carta veio tirar toda a incerteza. Aliás, está definitivamente acabada. Tomo todas as disposições necessárias para recobrar a minha liberdade e poder ir juntar-me a vós nos primeiros dias de Agosto. Sinto cada vez mais que estou na verdade, tomando esta decisão; começo, contudo, a entrever a dose de coragem que vou precisar de ter para consumar o sacrifício. Mas conto com o Sagrado Coração e com o coração da nossa Mãe, para levar a empresa a bom termo.
«Não pensava que fosse tão complicado deixar o mundo: quando se considera o sacrifício nos outros, parece não ser nada; quando nos toca, a situação muda totalmente e as coisas surgem-nos a outra luz. O que me consola e atrai, é que volto a sentir, no fundo de mim mesmo, o mesmo entusiasmo que no ano passado na altura do meu retiro.
«Tenho pressa em ir ocupar o meu lugar entre os trabalhadores que labutam no campo do Pai de família. Como tenho muitas razões para não me iludir sobre a soma de bem que poderei fazer por mim próprio e da energia que despenderei pessoalmente, anseio ao menos oferecer a minha vida, o meu sangue, pela difusão da Boa Nova. O Evangelho, é a minha convicção, só se propagará entre os povos selvagens, nas mesmas condições em que se propagou nos primeiros séculos: é preciso que a semente seja regada com o sangue dos mártires. Oh, se aprouvesse a Deus aceitar o meu por esta grande Obra, como lho daria de bom grado! Este desejo do martírio é muito ambicioso, mas parece-me que, sem ele, não pode haver verdadeiro missionário».