O 1º fundador dos espiritanos, Cláudio, tinha tudo para ser grande no mundo: riqueza, inteligência, incentivos da família para uma carreira brilhante no meio judiciário e político. Alguns retiros de discernimento vocacional, a inserção em grupos de oração juvenis e a catequese em bairros pobres de sua cidade levaram-no a uma primeira conversão: despiu a toga de advogado e escolheu ser padre pobre para os pobres. Enquanto estudava teologia, começou a ajudar alguns colegas pobres, repartindo com eles a sua mesada. Depois alugou uma casa para eles e obteve as sobras de comida da Faculdade para os alimentar. Finalmente, deu mais um passo, decisivo: de pobre para os pobres fez-se pobre com os seus pobres, passando a viver em comunidade de vida com eles. No Pentecostes de 1703, fizeram juntos um retiro em que todos prometeram a Deus que tão logo fossem padres estariam disponíveis para irem para as paróquias mais pobres da França, para onde ninguém mais quisesse ir e até para a missão além-fronteiras. Assim nascemos.
Todos os anos, pelo Pentecostes, o nosso superior geral nos manda uma mensagem de incentivo espiritual missionário. A de 2017 é um apelo forte à disponibilidade para ir para onde seja mais difícil e haja menos voluntários. Disponibilidade é a nossa “marca registada” e por ela podemos aferir o grau da nossa fidelidade ao carisma fundacional, na qual reside, assim o creio, a garantia do nosso crescimento. Disponibilidade, há quem a tome por passividade, deixar-se ir ao sabor do vento. É isso também, mas sem se deixar adormecer em doce embalo porque mudanças na direção do vento exigem novos rumos na vida. Dis+ponibilidade vem de dispor, é variedade de “ponências”, de atitudes, de abertura ao que é novo. É não mesmice.
Imagem de disponibilidade é o cata-vento, tratado tão mal como significando até uma pessoa desatenta, um cabeça-no-ar, um vira-casacas. Ele é, isso sim e muito simplesmente, um capta vento, sempre a virar-se para ele para o sentir todo. Não o assustam o que chamamos de ventos contrários porque contrariedades são desafios, não empecilhos. Durante muito tempo os barcos à vela só navegavam com ventos de feição. Até que alguns acreditaram que outra navegação era possível. Surgiram as velas triangulares e a navegação à bolina, e desde então só mesmo as calmarias metem medo aos velejadores. Se não há vento, se o Espírito de Deus não sopra e faltam profetas, façamos penitência que grande deve ter sido o nosso pecado.
Quem me dera ser cata-vento, sorver o Espírito de Deus, captá-lo (= catá-lo) sem pretensão de o aprisionar, e ser missionário sempre, mesmo na doença ou inatividade. Que Ele me ensine, desde já, a navegar à bolina.
P. José Gaspar