“Jesus Cristo é o rosto da misericórdia do Pai” (Misericordiae Vultus, 1). É deste modo que começa a Bula com que o Papa Francisco proclamou o Ano da Misericórdia para toda a Igreja. No coração do Santo Padre está o desejo que a Igreja se torne hoje e cada vez mais o “sinal eficaz do agir do Pai”, que se vê no rosto de Cristo – “Quem me vê, vê o Pai” (cf. Jo 14, 9)
Palavra de Deus
Jesus viu um homem chamado Mateus, sentado no posto de cobrança, e disse-lhe: «Segue-me!» E ele levantou-se e seguiu-o. Encontrando-se Jesus à mesa em sua casa, numerosos cobradores de impostos e outros pecadores vieram e sentaram-se com Ele e seus discípulos. Os fariseus (…) diziam aos discípulos: «Porque é que o vosso Mestre come com os cobradores de impostos e os pecadores?» Jesus ouviu-os e respondeu-lhes: «(…) Prefiro a misericórdia ao sacrifício. Porque Eu não vim chamar os justos, mas os pecadores.»
Mt 9, 9-13
Contemplar Cristo, o rosto da misericórdia
Mais do que belas dissertações sobre o rosto de Cristo, importa sobretudo vê-Lo! Fazendo uma viagem através do tempo podemos percorrer os mesmos caminhos em que o Senhor andou. Procuremos observá-lo quando se depara com aquele cobrador, ávido de cobrar mais e mais impostos, odiado por todos por causa disso mesmo, habituado a que o olhassem com olhares de ódio. E de repente, aparece Jesus! Deve ter sido impressionante o olhar de Jesus sobre aquele homem que, mal ouviu o “Segue-me” do Mestre, não hesitou e seguiu-O.
O rosto de Jesus era diferente. Revelava um “olhar cheio de misericórdia que perdoava os pecados daquele homem” (MV, 8). E como quem vê Jesus vê o Pai, Mateus experimentou na sua história o que o Papa diz a propósito das parábolas dedicadas à misericórdia: “a natureza de Deus como a dum Pai que nunca se dá por vencido enquanto não tiver dissolvido o pecado e superada a recusa com a compaixão e a misericórdia” (MV, 9). É pelo olhar cheio de compaixão que o Senhor vem curar os pecadores, um olhar que purifica o coração humano como o ouro é purificado no fogo.
E, como também recordava o Papa logo no início do seu pontificado, Deus nunca se cansa de perdoar (Ângelus de 17-03-2013), nunca se dá por vencido, e vai procurar o pecador com o Seu olhar até que este se converta e viva! (cf. Ez 18, 23). Experimentar desta maneira o amor de Deus é o primeiro passo para ser cristão, ou seja, para pertencer ao pequeno grupo daqueles que, tocados pela compaixão de Deus, se sentam à Mesa com Ele e O seguem para todo o lado.
Pistas de reflexão
- Olhando para a minha história de vida, onde encontro o rosto misericordioso de Cristo?
- Na vida de oração, que tempo dou à contemplação de Cristo, o rosto da Misericórdia?
Da contemplação à ação
Misericordiosos como o Pai é o lema que o Papa Francisco escolheu para viver o Ano da Misericórdia. É um apelo à ação, a “dar de graça o que de graça recebemos” (cf. Mt 10,8). “Tocados pela Sua compaixão, podemos também nós tornar-nos compassivos para com todos” (MV, 14).
São inúmeras e muito urgentes as situações que carecem da presença amorosa dos cristãos enquanto o novo rosto de Cristo na terra após a Sua subida aos Céus. A doença mais terrível e paralisante é a indiferença, que o Papa Francisco denunciou convictamente numa das primeiras saídas de Roma, quando se dirigiu a Lampedusa, uma ilha em Itália, onde se encontram milhares de migrantes em grande sofrimento, na busca por uma vida melhor.
Viver o Ano da Misericórdia, implica levar muito a sério o discurso de Jesus sobre o dia do Juízo, em que Ele se identifica com o faminto, o sedento, o estrangeiro, o nu, o doente e o preso (cf. Mt 25, 31-45). É no concreto da vida que a Igreja deve anunciar a misericórdia de Deus. Ninguém contou a Mateus como era o olhar de Jesus. Ele próprio O viu, na sua história de vida. Uma história triste de amargura para si e para os outros, mas que tocada pelo olhar do Senhor se transformou por completo. E a partir daí, Mateus seguiu Jesus, sendo admitido ao número dos Apóstolos.
Estar à escuta da Palavra de Deus é condição essencial para ser capaz de misericórdia. Significa “recuperar o valor do silêncio, para meditar a Palavra que nos é dirigida. Deste modo, é possível contemplar a misericórdia de Deus e assumi-la como próprio estilo de vida” (MV, 13). E, deste modo, é possível ser Cristo, o rosto da misericórdia.
Pistas de reflexão
- Que situações concretas existem perto de mim que necessitam do olhar misericordioso de Jesus?
- Que dificuldades tenho em assumir a misericórdia divina como “estilo de vida”?
Um oásis de misericórdia
Esta é a meta que o Papa Francisco estabeleceu para cada uma das nossas paróquias, comunidades, associações… (MV, 12). Perguntemos aos que nos visitam, que encontram eles? Um oásis de misericórdia? Deus queira que sim!
Possamos nós celebrar muitas vezes o sacramento da penitência, para que, olhados e tocados pelo rosto misericordioso de Jesus, nos tornemos também em “instrumentos de perdão, porque primeiro o obtivemos nós de Deus” (MV, 14)
P. Miguel Ribeiro