A maioria de nós pode dizer, por esta altura, que o descanso e as experiências vividas nas últimas férias são já coisas do passado. O título deste texto podia ter a ver com isso mas o assunto é outro. Recomeçar, de novo e melhor tem a ver neste caso com desastres naturais. Vem o tema a propósito do Dia Internacional para a Redução de Catástrofes que se comemora desde 1989 por iniciativa da Assembleia Geral das Nações Unidas. Inicialmente celebrado na 2ª quarta-feira do mês de Outubro, passou a ser celebrado desde 2010 no dia 13 de outubro.
O desafio colocado pelos desastres naturais é muito transversal e transdisciplinar, motivo pelo qual muitos contestam que os desastres sejam de facto naturais. Com efeito, os desastres naturais ocorrem quando se dá a manifestação de um determinado processo natural de perigo sobreposto a um determinado contexto humano (uma cidade, um campo agrícola, uma autoestrada, etc.). Mais, a manifestação do tal processo natural de perigo é, em certos casos, desencadeada ou ampliada pela ação humana sobre o ambiente.
Tão transversal e complexo é este tema que a Carta Encíclica Laudato Si do Santo Padre Francisco sobre o cuidado da casa comum lhe dedica uma atenção particular. A carta é tudo menos indiferente ao tema da redução de catástrofes, tal a intrincada conexão que se estabelece entre as suas causas e consequências, entre Natureza e Homem.
Diz-nos Francisco que “não há duas crises separadas: uma ambiental e outra social; mas uma única e complexa crise sócio-ambiental.” E continua mais adiante: “quando as pessoas se tornam auto-referenciais e se isolam na própria consciência, (…) parece não ser possível, para uma pessoa, aceitar que a realidade lhe assinale limites. (…) Neste horizonte, as normas serão respeitadas apenas na medida em que não contradigam as necessidades próprias.” Alerta o Papa que um egoísmo assim gera consequências não unicamente em termos de catástrofes naturais, bem como e também em consequência delas, de intensas crises sociais.
A Laudato Si foi assinada pelo Papa no dia 24 de maio de 2015. Umas semanas antes, a 18 de março de 2015, terminava em Sendai, no Japão, a 3ª Conferência Internacional para a Redução do Risco de Desastres, de onde emanou um documento de referência designado abreviadamente como o “Quadro de Sendai 2015-2030”. É impossível não estabelecer uma ligação entre ambos os momentos e os respetivos documentos.
As soluções propostas em Sendai focam-se na melhoria do conhecimento sobre os riscos e na maior articulação entre as várias políticas com relevo para a gestão dos riscos (políticas ambientais, de alterações climáticas, energéticas, de proteção civil, de urbanismo, de educação, etc.) tendo em suma, como objetivo maior, o aumento da resiliência das populações face aos desastres.
Porém, a ligação mais bonita que encontro entre estes dois referenciais (Laudato Si e Quadro de Sendai), estas duas bússolas para a Humanidade, é a que desenvolvo de seguida. Uma das prioridades de ação saídas da conferência de Sendai é o princípio de construir de novo e melhor (“Build Back Better” no original em Inglês). Tendo presente o Ano Santo da Misericórdia, parece-me muito interessante a atitude de não nos deixarmos permanecer na situação de derrota que significa o desastre. Mais, ela denota a preocupação em nos reconstruirmos de modo diferente àquele que ficámos, ou seja, melhor que antes do desastre. Com o pecado e com o caminho de conversão de cada um se passa o mesmo. Depois do pecado, depois de aberta a ferida – porque mesmo cometido contra os outros, o pecado fere-nos de diversos modos a nós mesmos –, a procura da reconciliação e o regresso à graça “melhor que antes”. O conceito de resiliência que tanto se usa em relação aos desastres naturais pode bem ser aplicado também em relação à nossa conversão. Deus dá-nos a certeza de que recuperaremos no pós-pecado (no pós-desastre) se n’Ele permanecermos, firmes na Fé.
Pedro Santos