Domingo da Ascensão
O facto de hoje escutarmos duas versões da Ascensão de Jesus, as quais, embora escritas pelo mesmo evangelista (S. Lucas), não são de todo coincidentes, só nos obriga a não ficarmos pela leitura simplista da letra – subida de Jesus para o Céu – e tentarmos chegar àquilo que S. Paulo pedia para os cristãos de Éfeso: compreender a esperança a que foram chamados, os tesouros de glória da sua herança e a incomensurável grandeza do poder de Deus para os crentes.
De facto, muita coisa nos é dita através das linhas e entrelinhas destes textos. Aos circunstantes, é censurada a atitude boquiaberta e estática perante o desaparecimento de Jesus, porque é preciso pôr-se a caminho, com a força do Espírito Santo. É que, na vida cristã, torna-se indispensável combinar contemplação e ação.
Sem compromisso ativo, facilmente caímos num pietismo alienante, que nos permite viver anestesiados frente às injustiças, às pobreza e misérias de grande parte dos homens e mulheres do nosso tempo. Esta tem sido uma das grandes acusações feitas à Igreja nos últimos séculos, não sem alguma razão. Mas, sem contemplação, também facilmente nos esgotamos num ativismo febril sem rumo, sem consistência, qual fogo de artifício, que tem tanto de bonito como de efémero, tentação em que, por vezes, se tem caído, face à premência gritante de situações verdadeiramente insuportáveis.
Não se trata, evidentemente, de ter um pé ‘cá’ e um pé ‘lá’, o que significaria, na prática, nem ‘cá’, nem ‘lá’. Precisamos de ter os dois pés ‘cá’ para nos comprometermos na transformação deste mundo, mas tendo sempre diante dos olhos o projeto elaborado por Deus, pois o modelo vem de ‘lá’. É cada um de nós e cada comunidade cristã que precisa de encontrar o equilíbrio deste binómio.
E o mundo de hoje tem um novo horizonte: o das redes sociais e que é o tema da mensagem do Papa Francisco para o Dia Mundial das Comunicações Sociais, que hoje se celebra. Com efeito, estas ‘redes’ tanto podem ser “uma oportunidade para promover o encontro com os outros, como podem agravar o autoisolamento, qual teia de aranha, capaz de capturar”.
Se, como cristãos, “nos reconhecemos como membros do único corpo cuja cabeça é Cristo” e “criados à imagem e semelhança de Deus, que é comunhão e comunicação-de-Si”, o “panorama atual convida-nos a todos nós a investir nas relações, a afirmar – também na rede e através da rede – o carácter interpessoal da nossa humanidade”, que nos ajude a passar de “indivíduos” – que o Papa designa como ‘eremitas sociais’ – a “pessoas”, um “rosto” voltado para o outro, comprometido com os outros”. Com efeito – conclui o Papa – “a Igreja é uma rede tecida pela comunhão eucarística, onde a união não se baseia nos gostos [“like”], mas na verdade, no “amén” com que cada um adere ao Corpo de Cristo, acolhendo os outros”.