1º Domingo da Quaresma
As inúmeras manifestações de folia que, na última semana, encheram não só ruas, mas também jornais e telejornais, com recurso a imagens mais ou menos (in)decentes no trajar, na linguagem e nos gestos, não conseguiram mais que iludir a realidade fundamental do nosso tempo: escasseiam os arco-íris de paz, de esperança! Em vez disso, como afirma o papa Francisco, multiplicam-se tanto os “encantadores de serpentes”, vendendo a sua ‘banha de cobra’ traduzida no encandeamento “pelas adulações dum prazer de poucos instantes, que se confunde com a felicidade”, pelo fascínio da “ilusão do dinheiro, quanto este, na realidade, os torna escravos do lucro ou de interesses mesquinhos”, como os “charlatães”, “que oferecem soluções simples e imediatas para todas as aflições” e que nos mergulham cada vez mais no “gelo do amor sufocado”. Como afirma o Papa “é preciso aprender a não se deter no nível do imediato, do superficial, mas reconhecer o que deixa dentro de nós um rasto bom e mais duradouro, porque vem de Deus e visa verdadeiramente o nosso bem”.
Esta pode ser uma linguagem que desagrade a muita gente, mas este Papa tem a coragem de chamar as coisas pelo seu nome, ao fazer o diagnóstico correto da situação atual: “o que apaga o amor é, antes de mais nada, a ganância do dinheiro, “raiz de todos os males”; depois dela vem a recusa de Deus, preferindo a nossa desolação ao conforto da sua Palavra e dos Sacramentos”.
Não menos corajosamente, ele denuncia também os efeitos: “tudo isto se permuta em violência que se abate sobre quantos são considerados uma ameaça para as nossas “certezas”: o bebé nascituro, o idoso doente, o hóspede de passagem, o estrangeiro, mas também o próximo que não corresponde às nossas expectativas” e sobre a própria natureza: “a terra está envenenada por resíduos lançados por negligência e por interesse; os mares devem, infelizmente, guardar os despojos de tantos naufrágios das migrações forçadas; os céus são sulcados por máquinas que fazem chover instrumentos de morte”.
E – acrescenta o Papa – nem as comunidades cristãs estão imunizadas contra este risco do resfriamento do amor:, enumerando “a acédia egoísta, o pessimismo estéril, a tentação de se isolar empenhando-se em contínuas guerras fratricidas, a mentalidade mundana que induz a ocupar-se apenas do que dá nas vistas, reduzindo assim o ardor missionário”.
Para a cura, o Santo Padre aponta “o remédio doce da oração, da esmola e do jejum”, pois “dedicando mais tempo à oração, possibilitamos ao nosso coração descobrir as mentiras secretas, com que nos enganamos a nós mesmos”. Por sua vez, “a prática da esmola liberta-nos da ganância e ajuda-nos a descobrir que o outro é nosso irmão e que, aquilo que possuo, nunca é só meu”. Por fim, “o jejum tira força à nossa violência. Ele desperta-nos, torna-nos mais atentos a Deus e ao próximo, reanima a vontade de obedecer a Deus, o único que sacia a nossa fome”.
Esta é a sua proposta, não apenas para os cristãos, mas para quantos se afligem com “a difusão da iniquidade no mundo”; para aqueles que se preocupam com “o gelo que paralisa os corações e a ação” ; para quantos veem “esmorecer o sentido da humanidade comum”.
Estes são os meios que Deus, através da Igreja, põe à nossa disposição ao longo desta Quaresma, para que nos tornemos autênticos arco-íris de paz e de esperança para os homens e mulheres de hoje e, através de nós, possam redescobrir o verdadeiro rosto de Deus, aquele Deus que, em Noé, nos garantiu: “sempre que Eu cobrir a terra de nuvens e aparecer nas nuvens o arco, recordarei a minha aliança convosco e com todos os seres vivos e nunca mais as águas formarão um dilúvio para destruir todas as criaturas”.