O Paraguai acolheu-me, como sempre, de braços abertos. É um povo simples, mas bom…ou talvez mesmo, é bom porque é simples. Veio-me muitas vezes à memória, nestes dias paraguaios, esta excelente canção: ‘Eu vim de longe, de muito longe, o que eu andei para aqui chegar!’. Sim, foi isso: de Roma a Assunção, via Madrid, são muitas horas de voo. Mas das periferias da capital até Lima, passando por Naranjito e Resquin, são uns longos 250 kms, a passar por verdes descampados, aldeias e vilas onde se sente a feliz vibração latino americana, mas também se percebe bem que o país é pobre e muita gente vive com dificuldades extremas.
O P. Emmanuel, da Serra Leoa, há alguns anos neste país, levou-me até Naranjito e Resquin, onde me esperavam o P. Elvino, Cabo Verdiano e o P. Francis, do Malawi. Em quatro visitas ao Paraguai, nunca tinha pisado estas terras do interior da Diocese de San Pedro. Foi uma alegria encontrar os confrades e viver com eles alguns dias muito intensos de celebrações, visitas e conversas, em tempo de novena de Natal. Deu para perceber melhor a realidade do interior agrário deste país, abandonado como quase todos os interiores, por esse mundo além. O povo tem dificuldades para sobreviver, mas é lutador e nunca atira a toalha ao chão. E tem uma fé enorme que pratica com exuberância, sempre com um respeito enorme pela figura do ‘paí’, como chamam ao Padre em língua guarani.
‘No Paraguai não falta alegria. E é terra abençoada com muita comida. São pessoas pobres, mas sempre alegres e solidárias’ – dizia-me o P. Francis a caminho da comunidade ‘25 de Dezembro’ para uma Missa de Primeiras Comunhões. Esta foi um das constantes: cada dia acompanhava um dos padres às missas nas Capelas. São 80, divididas em 8 zonas, numa área de 70 kms. Na maioria das vezes, tem-se de deixar a estrada principal, a única alcatroada e saltar em buracos, apanhando a poeira que se levanta. E, como me contou o P. Elvino, o alcatrão chegou depois de, em 2017, o povo ter aproveitado a visita do Bispo para fazer um corte de caminho, impedindo a circulação. Esta manifestação foi tão badalada que as autoridades acabariam por alcatroar a estrada principal que se mantém em ótimo estado. O único problema – dizia-me uma líder de comunidade – é que há muitos acidentes!’ E – fazendo-me olhar para a estrada, alertava-me: ‘o Paí vê aquela moto guiada por uma criança de uns dez anos, com mais dois atrás e sem capacetes? É sempre assim! – lamentava-se! Aristides Pereira, um dos animadores de comunidade, vindo do interior, partilhava comigo a história desta região: ‘Não tinha gente, era mato puro. Começamos a chegar há uns trinta anos e construímos por ocupação. Depois acabamos por legalizar os terrenos e agora somos dezenas de pequenas comunidades!’. Os Padres, antes ou depois das celebrações, sempre seguidas de comidas e bebidas tradicionais ( a tchipa, o cosido, a sopa, a empanada…), levaram-me, mato adentro, visitar algumas das comunidades, algumas delas indígenas. Há muito gado, muita soja, muita mandioca…Mas a chuva está a rarear e vêem-se as culturas a secar. Houve, há dois meses, um furacão que passou e derrubou árvores e casas, levando o telhado de duas capelas. As alterações climáticas também se sentem, como diz D. Pedro, o Bispo de San Pedro, na sua última Carta Pastoral.
Uma das glórias das pequenas povoações é serem capitais de alguma coisa: Guayeibi é capital da banana e do ananás. Lá paramos e compramos! Naranjito é a capital das laranjas doces. San Vicente é a capital da mandioca. Mas, mais interessante é que Resquin, sede da Paróquia, é a capital do Mbeju. Fomos à Casa do Mbeju tomar um pequeno almoço: é uma espécie de empada com farinha de milho e mandioca, queijo e fiambre. E quem promoveu o 1º Festival Nacional do Mbeju foi o P. Mietek, espiritano polaco que era o pároco em 2009!
Lima – lá onde chegaram os Espiritanos há 55 anos – acolheu-me para a vigília e festa do Natal. Os Padres Victor (português) e Fidelis (Nigeriano) são os responsáveis de uma longa geografia povoada de comunidades. As Missas foram de casa cheia, celebradas em ambiente de muita festa. Natal, mesmo com um calor de rebentar, é sempre Natal.
Desejo a quantos me ouvem e lêem um fim de ano abençoado e que 2023 nasça com mais paz, mais justiça, mais partilha e mais abraços.