‘Um coração aberto ao mundo’ é tema do IV Capítulo da ‘Fratelli Tutti’. Ao pôr limites às fronteiras que o mundo ergueu, o Papa é claro: ‘os nossos esforços a favor das pessoas migrantes que chegam podem resumir-se em quatro verbos: acolher, proteger, promover e integrar’ (FT 129). Devemos oferecer aos migrantes a possibilidade dum novo desenvolvimento (cf. FT 134) pois, ‘se forem ajudados a integrar-se, eles são uma bênção, uma riqueza e um novo dom que convida a sociedade a crescer’ (FT 135).
Também é preciso fazer um intercâmbio fecundo entre países, pois a ajuda mútua a todos beneficia e faz aumentar a convicção de que, ‘ou nos salvamos todos ou não se salva ninguém’ (FT 137) porque tudo está interligado. No acolhimento, urge cultivar a gratuitidade fraterna evitando comércios calculistas e sem humanidade. Não se podem catalogar os imigrantes como usurpadores que nada oferecem. Muitas vezes se pensa que ‘os pobres são perigosos ou inúteis e os poderosos são generosos benfeitores’ (FT 141). Quanto mais acolhedora e aberta for uma sociedade, mais se geram culturas saudáveis assentes em valores universais. E o Papa Francisco deixa bem claro que ‘hoje nenhum Estado nacional isolado é capaz de garantir o bem comum da própria população’ (FT 153).
É necessária uma política melhor, ‘colocada ao serviço do verdadeiro bem comum’ (FT 154). As opções por políticas populistas e liberais estão a ser negativas para a vida das pessoas pois, ‘em ambos os casos, é palpável a dificuldade de pensar num mundo aberto onde haja lugar para todos, que inclua os mais frágeis e respeite as diferentes culturas’ (FT 155).
O trabalho é a grande oferta que um governo pode fazer aos seus cidadãos, pois assegura a todos uma vida digna e comprometida com a construção da sociedade.
O mercado não resolve todos os problemas e a especulação financeira continua a fazer estragos. Lembra o Papa: ‘a fragilidade dos sistemas mundiais perante a pandemia evidenciou que nem tudo se resolve com a liberdade do mercado (…). Devemos voltar a pôr a dignidade humana no centro e sobre este pilar devem ser construídas as estruturas sociais alternativas de que precisamos’ (FT 168).
Francisco lança um alerta: ‘o séc.XXI assiste a uma perda de poder dos Estados nacionais, sobretudo porque a dimensão económico-financeira, de caracter transnacional, tende a prevalecer sobre a política’ (FT 172). Para evitar este risco, há que reformar a ONU para que ’seja possível uma real concretização do conceito de família das nações’ (FT 173). A fraternidade universal e a paz social exigem uma boa política que não esteja submetida ‘à economia nem aos ditames nem ao paradigma eficientista da tecnocracia’ (FT 177).
O combate à corrupção tem de ser sem tréguas. E só há grandeza política ‘quando se trabalha com base em grandes princípios e pensando no bem comum a longo prazo’ (FT 178). A caridade social é a alma de uma saudável ordem social e política, na busca do bem comum: ‘a caridade está no centro de toda a vida social sadia e aberta’ (FT 184). Os políticos devem ajudar quem é pobre, mas também ‘modificar as condições sociais que provocam o seu sofrimento (…), criando um emprego, exercendo uma forma sublime de caridade que enobrece a sua ação política’ (FT 187). Têm de cuidar dos mais frágeis, daqueles que são vítimas das violações dos direitos humanos.
‘Ainda estamos longe duma globalização dos direitos humanos mais essenciais’ (FT 189). O papa condena a fome criminosa, as toneladas de alimentos que se estragam e o tráfico de pessoas, uma ‘vergonha para a humanidade que a política internacional não deveria tolerar’ (FT 189).
A intolerância fundamentalista também é visada pelo Papa Francisco, pois danifica as relações entre pessoas, grupos e povos e não permite a escuta de vozes diferentes. Pede o Papa: ‘Não nos resignemos a viver fechados num fragmento da realidade’ (FT 191). Aos fundamentalismos unem-se o ódio e o medo.
A Política é uma arte de amar, potenciando ‘as reservas de bem que, apesar de tudo, existem no coração do povo’ (FT 196). Os políticos devem deixar-se vencer pela ternura provocada pelos pobres e frágeis do nosso mundo. Não devemos olhar aos resultados palpáveis, mas à fecundidade da intervenção política: ‘se consigo ajudar uma só pessoa a viver melhor, isso já justifica o dom da minha vida’ (FT 195).
No ar, ficam muitas perguntas, algumas delas dolorosas: ‘em que fiz progredir o povo? Quanta paz social semeei?’ (FT 197). O Papa avança a reflexão ao propor o diálogo rumo à amizade social.