15º Domingo do Tempo Comum
Seguramente, não era esta a resposta que aquele doutor da lei esperava receber de Jesus, por mais bem intencionado que estivesse ao questioná-l’O sobre a forma de alcançar a vida eterna! É que esta resposta vai muito além daquilo que ele conhecia da Sagrada Escritura. Por isso, este ensinamento de Jesus transborda do ambão para envolver e inundar cada um de nós e nos levar a passarmos da pergunta “e quem é o meu próximo?” para estoutra: de quem é que o Senhor me faz próximo no dia-a-dia da minha vida?
De facto, na história contada por Jesus, o sacerdote e o levita também ‘viram’ aquele homem desvalido, mas passaram adiante e seguirem o seu caminho, como se nada fosse com eles. Embora seguindo pelo mesmo caminho do sacerdote e do levita, só o samaritano manifesta abertura ao outro, mesmo que ele seja um ‘desvalido’, mesmo que lhe estrague os seus planos.
É que, para além dos seus projetos, ele aceita a agenda de Deus, ele aceita fazer-se próximo daquele homem que precisa de ajuda. Por isso, não vira a cara para fingir que não viu, não acelera o passo para parecer que vai com pressa, não olha para o relógio, simulando que já está atrasado, nem se desvia dele para manter a pureza legal: aceita ‘tropeçar’ neste homem sem voz e alterar por completo o seu programa, que só voltará a retomar depois de o ter entregue aos cuidados do estalajadeiro e de assegurar o pagamento de todas as despesas.
O texto nada nos diz sobre as perdas ou prejuízos financeiros que daqui terão advindo para o samaritano. Cristo só nos diz que este é que é o caminho que nos conduz à “vida eterna”! Lógica terrível e desafiante esta! No mundo da pressa e da pressão para se chegar primeiro, para se ganhar mais, para se garantir o sucesso, Cristo diz-nos que o lucro está no ‘perder tempo’, no ‘dar atenção ao que mais precisa’, no ‘dar a prioridade ao outro’!
António Couto, no seu livro ‘Como uma dádiva’, escreve: “viver a partir de mim, seguindo espontaneamente ou dando livre curso aos meus desejos, projetos e instintos, buscando a autossatisfação, integrando e dominando o outro para o pôr ao meu serviço, ou viver a partir do outro, pondo-me eu ao seu serviço, são duas maneiras irreconciliáveis de viver, e está aqui o primeiro desafio que eu sou quotidianamente chamado a enfrentar, e é também o primeiro desafio que a Bíblia lança à moral”.
É garantido que, por este caminho, não ganhamos este mundo, mas ganhamo-nos seguramente a nós mesmos e, com isso, a vida eterna! O percurso a ser realizado por cada um de nós está apontado por S. Lucas nos verbos por ele usados em forma (con)sequencial: viu; revolveram-se-lhe as entranhas; aproximou-se; ligou as feridas; tratou-as com azeite e vinho; levantou-o; conduziu-o à estalagem; cuidou dele; comprometeu-se a custear todas as despesas; comprometeu também o estalajadeiro.
Apareçam os ‘bons samaritanos’ que desvalidos e meio-mortos se encontram em todas as esquinas e caminhos. ‘Próximos’ não faltam: haja quem aceite aproximar-se deles! É a mim e a ti que Jesus diz hoje: “vai e faz o mesmo”!