14º Domingo do Tempo Comum
Esta ordem de Cristo é bem conhecida da Igreja e não é só agora – que a crise de vocações para o ministério sacerdotal ou para a vida religiosa se tornou verdadeiramente preocupante, pelo menos no hemisfério norte, – que ela mobiliza muitos cristãos à oração.
Mas, apesar do seu modo taxativo e da clareza da sua formulação, ela suscita-me dúvidas: não é o mesmo Senhor que procurou trabalhadores para sua vinha até à “undécima hora” (cf. Mt. 20) e que “amou tanto o mundo que lhe entregou o seu próprio Filho” (Jo.3)? Como precisa agora de ser ‘tocado’ pelos nossos pedidos para enviar trabalhadores para a sua messe?
No texto de hoje de S. Lucas parece-me encontrar resposta para estas dúvidas: é que ao mandato “pedi ao senhor da messe” segue-se o envio imediato dos seus ouvintes – “Ide” – e eram ‘setenta e dois’, isto é, todos os seus discípulos!
Então, esta oração pelas vocações talvez seja mais para que o Senhor nos torne disponíveis para sermos enviados do que para que Ele envie os outros. Não é para aqui que aponta o lema deste ano missionário em Portugal “todos, tudo, sempre em missão” e do outubro missionário “batizados e enviados”? Mas a realidade das nossas comunidades cristãs é bem diferente: ao lado de um pequeno núcleo de cristãos comprometidos, sobre os quais recai toda a responsabilidade e todo o trabalho, mantém-se um elevado número de cristãos meramente espectadores e consumidores dos produtos religiosos, que até manifestam alguma disponibilidade pontual, mas que recusam assumir um compromisso permanente.
Por isso, a maioria das comunidades cristãs vai definhando na eterna repetição das mesmas receitas, sem criatividade, sem alegria, sem entusiasmo contagiante. Esquecemo-nos que a própria ‘missa’ é ‘missão’ e traduzimos o “Ide” final, não por envio, mas por um (finalmente) ‘acabou’: podemos ir em paz, pois a obrigação está cumprida!
Talvez seja oportuno relembrar as afirmações de Bento XVI na cidade do Porto, aquando da sua visita ao nosso País: É preciso voltar a anunciar com vigor e alegria o acontecimento da morte e ressurreição de Cristo, coração do cristianismo, fulcro e sustentáculo da nossa fé, alavanca poderosa das nossas certezas, vento impetuoso que varre qualquer medo e indecisão, qualquer dúvida e cálculo humano. A ressurreição de Cristo assegura-nos que nenhuma força adversa poderá jamais destruir a Igreja. Portanto a nossa fé tem fundamento, mas é preciso que esta fé se torne vida em cada um de nós. Assim há um vasto esforço capilar a fazer para que cada cristão se transforme em testemunha capaz de dar conta a todos e sempre da esperança que o anima: só Cristo pode satisfazer plenamente os anseios profundos de cada coração humano e responder às suas questões mais inquietantes acerca do sofrimento, da injustiça e do mal, sobre a morte e a vida do Além”.
Na mesma linha, escreve o Papa Francisco na sua mensagem para o próximo Dia Mundial das Missões: “Sê homem de Deus, que anuncia Deus (cf. Carta ap. Maximum illud): este mandato toca-nos de perto. Eu sou sempre uma missão; tu és sempre uma missão; cada batizada e batizado é uma missão. Quem ama, põe-se em movimento, sente-se impelido para fora de si mesmo: é atraído e atrai; dá-se ao outro e tece relações que geram vida. Para o amor de Deus, ninguém é inútil nem insignificante. Cada um de nós é uma missão no mundo, porque fruto do amor de Deus”.
Por isso, vale a pena continuar a pedir ao “senhor da messe que envie operários para a sua messe”, mas não nos esqueçamos que, antes de mais, é cada um e cada uma de nós que Ele quer enviar! Estamos disponíveis para ser enviados?