XXXVI Semana de Estudos sobre a Vida Consagrada
A 36ª Semana de Estudos sobre a Vida Consagrada ficará na história por ser o ano da Covid-19, que nos obrigou a mudanças várias, imprevistas. Pensou-se, inicialmente, no formato habitual de nos encontramos em Fátima quatro dias antes do começo da Quaresma; dada a incerteza de tal não ser possível devido ao confinamento, optou-se, depois, pela realização “on line”; e acabou-se, finalmente, pela solução mais simples de colocar os textos por via digital ao alcance dos leitores.
Seja como for, sabendo que há mais vida para além do vírus e que “O desafio da fidelidade na Vida Consagrada”, tema da Semana, é importantíssimo, não se desistiu. E aqui estamos a fazer esta reflexão, iluminados pela Instrução da CIVCSVA que tem o título “O dom da fidelidade. A alegria da perseverança”.
“Não é fácil viver como pessoa consagrada nos dias de hoje” – lê-se no Documento. Regista-se, de facto, uma verdadeira hemorragia ou perda de sangue – dois a três mil abandonos por ano, quase dez por dia. E a par dos que batem com a porta, outro fenómeno preocupante – o dos que permanecem no seu lugar, mas levam uma vida desnatada, medíocre, mortiça.
Não se esqueça, no entanto, um dado luminoso: nos dias de hoje também abunda a fidelidade. E a prova disso está na legião dos mártires.
Há duas classes de martírio. Martírio vermelho, o de sangue: nestes tempos, como sempre, muitos homens e mulheres testemunham a sua fé em Cristo Senhor com a doação da própria vida. E martírio branco – o testemunho quotidiano, silencioso, humilde, heroico, de tantas pessoas que prestam serviço nas obras de assistência aos mais desprotegidos, nas paróquias, nas escolas, nos mosteiros, nas missões, por meio da oração, do sofrimento, do trabalho invisível.
É hora de analisarmos a situação, detetarmos sombras que podem explicar muitos abandonos, reconhecermos a nossa incapacidade para atrair vocações, a falta de coragem para enfrentar os problemas, a identidade pouco nítida, as relações difíceis interpessoais e comunitárias, a tensão entre missão e comunidade, o inadequado uso das novas tecnologias da comunicação, a globalização da superficialidade…
Há razões, todavia, para acreditarmos na vida consagrada e termos autoestima vocacional. Mais do que nunca, a vida consagrada está chamada a ser sinal e fermento do Reino, luz de Deus no mundo que parece querer afastá-lo do horizonte, perita em humanidade no meio de tanto egoísmo, oferta de generosidade e gratuidade…
É tempo de interiorizar e reter algumas ideias luminosas: que a nossa fidelidade se apoia na de Deus; que tem de ser uma fidelidade humilde, paciente, alegre, crescente, criativa; que tem de irradiar na direção de Cristo e do seu Evangelho, da Igreja e da sua Missão, da vida consagrada e do carisma do próprio instituto, dos homens e mulheres do nosso tempo, designadamente dos pobres.
É hora de investir em três processos que alimentam a fidelidade: discernimento, formação, acompanhamento espiritual; de insistir na formação da consciência e na procura da verdadeira realização pessoal; de redescobrir o valor da ascese e da disciplina como a “arte do discípulo”; de sublinhar, uma e outra vez, o papel insubstituível e decisivo da fraternidade, do cuidado mútuo, da amabilidade.
A este propósito, aproveita-se esta ocasião para apresentar as chaves de leitura da encíclica “Fratelli tutti” e os desafios que nos lança. A fraternidade é a única utopia que pode salvar o mundo e os seus habitantes, a Igreja e a Vida Consagrada.
Permitam-me desde já dizer bem-haja! – à Direção e Secretariado da CIRP, à Comissão Organizadora da Semana e, nomeadamente, ao Padre Manuel Barbosa que tornou possível toda esta montagem, e aos generosos conferencistas.
Bem-haja também todos os Consagrados que estão em Portugal. Ao cumprir-se um ano desde que vimos sofrendo o flagelo da pandemia, com os seus efeitos dolorosos, seguido dum cortejo de outras crueldades – o confinamento, a solidão, a falta de trabalho, a crise
económica, as más políticas, o afastamento dos amigos, a morte de seres queridos – damos graças pelo empenhamento de tantas pessoas dedicadas martirialmente a servir os idosos e os doentes.
Desta vez não estamos em Fátima, aos pés de Nossa Senhora, mas uma lâmpada brilha diante dos nossos olhos, a lâmpada do sim de Maria que nos atrai e docemente e nos indica a Fonte da fidelidade que todos nós procuramos.
É hora de rezar: “Concedei-me, Senhor, a graça de encontrar sempre a alegria no vosso serviço, porque é uma felicidade profunda e duradoira ser fiel ao Autor de todos os bens”.
Em nome da Comissão da Semana de Estudos,
Padre Abílio Pina Ribeiro