Fez o que sempre tinha feito. Mas aquele canto levou a uma recordação, a recordação levou a um olhar, o olhar levou ao arrependimento, o arrependimento às lágrimas, as lágrimas à conversão. O canto do galo que acordou Pedro do sono do medo (Lc 22,54-62) e o confrontou com o olhar de Jesus vai ecoar aos nossos ouvidos no Domingo de Ramos e na Sexta-feira Santa. Aquele galo, lembrado pelos quatro evangelistas, nunca mais deixou de cantar. Antes permaneceu pelos séculos como sinal de vigilância e acordar para a luz. Santo Ambrósio de Milão gravou-o num dos seus hinos que a liturgia traduziu: “A seu canto se anima o navegante, aplacam-se no mar as próprias vagas; e lavam-se da culpa as almas crentes como Pedro nas lágrimas choradas. Ergamo-nos portanto já sem medo; o galo faz erguer quem está deitado: increpa brandamente os sonolentos e rudemente acusa os renegados. A seu canto reaviva-se a esperança, a saúde aos enfermos já retoma; nova alegria a alma nos levanta e a vida em cada peito se renova.”
O canto do galo alerta os pecadores mas também defende os inocentes. Lembremos a lenda do Galo de Barcelos, ou a de Santo Domingo de la Calzada, em que um galo, já morto e cozinhado, se ergue e canta para provar a inocência de um jovem falsamente acusado. Mas nem só do seu canto se alimenta (salvo seja) a nossa aprendizagem. Santo Antonio Maria Claret retirava 8 ensinamentos com a sua observação: o galo me chama, e eu, como Pedro, devo lembrar meus pecados; galo canta em diversas horas do dia e da noite, assim eu devo louvar a Deus sempre; o galo vigia sua família dia e noite, eu devo cuidar noite e dia das almas que o Senhor me confiou; o galo, ao menor ruído ou ameaça de perigo, dá alarme, eu devo fazer o mesmo; o galo defende seu terreiro quando o gavião ou outro animal vem para atacar, eu devo defender as almas que o Senhor me confiou; o galo é muito generoso, quando encontra algo que sirva de alimento chama as galinhas para que comam, assim eu devo ser caridoso e generoso para com os necessitados; o galo, antes de cantar, bate as asas, eu devo bater as asas do estudo e da oração; o galo é muito fecundo, eu devo sê-lo espiritualmente.
Faz o que sempre tem de ser feito: a cantar, para lembrar que já é tempo de acordar, recordar e vigiar. Quando virem ou ouvirem um galo, não pensem na canja e no churrasco, mas respeitem-no, que até a Sagrada Escritura pergunta: “quem deu inteligência ao galo?” (Job 38,36).
Faz o que sempre tem de ser feito: a cantar, para lembrar que já é tempo de acordar, recordar e vigiar. Quando virem ou ouvirem um galo, não pensem na canja e no churrasco, mas respeitem-no, que até a Sagrada Escritura pergunta: “quem deu inteligência ao galo?” (Job 38,36).
“Crónica” é uma rubrica mensal do jornal “Ação Missionária“, pelo P. Aristides Neiva